segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A chantagem da dívida


Os líderes europeus reuniram-se neste domingo para aprovarem um pacote de ajuda monumental à economia irlandesa. 85 milhões de euros. Os irlandeses já não têm empregos, e mais uma vez na conturbada história do país recomeçaram a emigrar. As atenções dos mercados, ou dos especuladores, ou dos inimigos do euro e da União Europeia – os três conceitos confundem-se demasiadas vezes – já estão totalmente viradas para as próximas vítimas: Portugal e Espanha. Mas afinal o que provoca todas estas notícias apocalípticas?

Os Estados soberanos estão endividados. Isto não é necessariamente mau - na verdade um certo nível de alavancagem financeira é racional e desejável, tanto para indivíduos como para empresas para Estados. Ou seja, o endividamento óptimo não é zero. O problema é que, e deixando a análise do “porquê” para outra altura, o endividamento é demasiado alto e dura há muito tempo. Traduzindo: o Estado irlandês - e português, e espanhol, e alemão, e todos - precisa de dinheiro. E precisa dele agora.

Um indivíduo que necessite de crédito imediato pode encontrá-lo em vários locais: num banco a uma determinada taxa de juro, junto de família ou amigos (por vezes a uma taxa de juro nula, mas com riscos de ordem social), junto de usurários mais ou menos mafiosos (geralmente em condições draconianas e que podem implicar acabar no fundo do rio em caso de incumprimento)... Os Estados, por seu lado, financiam-se nos “mercados de capitais”, também em condições de verdadeira usura, emitindo obrigações para compradores - os títulos da dívida pública especificam daqui a quanto tempo é que o Estado paga de volta, e a que juros. Ora, estas obrigações estão sempre a vencer e para as pagar no momento devido, é preciso existir fundo de maneio. A Grécia teve de recorrer ao maciço Fundo de Estabilização do Euro porque tinha de reembolsar, em Março último, empréstimos contraídos há dez anos. Se naquela altura o fundo não tivesse sido criado, a Grécia tinha declarado bancarrota: não iria cumprir com os seus compromissos (tal como a Argentina fez perante o mundo em 2001, contra a vontade do FMI). E aí teria sido, pela interligação dos bancos mundiais à economia grega, o início da queda dos dominós. Idem para a Irlanda, Portugal e Espanha - sussurrando-se já também os nomes “Itália” e “Bélgica”.

Portugal, e todos os outros, continua muito regularmente a reembolsar os seus empréstimos contraídos há algum tempo. Para o fazer, bem como para estourar dinheiro em brinquedos novos como um novo aeroporto ou salvar um banco privado de ir à falência, precisa de... contrair mais dívida. É esse o problema agora. Portugal precisará, em 2011, de encontrar 40 mil milhões de euros - 75% dos quais para reembolsar empréstimos antigos, o resto para o défice do Estado. E se quem lhe empresta dinheiro exige tantos juros (mais de 7%) para compensar o “risco de incumprimento”... o fardo torna-se insuportável. A emigração portuguesa vai acelerar.