Parece ficção
ridícula, mas é a nossa realidade: em 2010, dois economistas americanos (Reinhart
e Rogoff) publicaram um estudo intitulado “Crescimento em tempo de dívida”.
Estudando os dados históricos de 44 países, os economistas analisaram a relação
entre a dívida pública e o crescimento económico e chegaram a uma bombástica
conclusão: se o Estado estiver razoavelmente alavancado, o crescimento médio do
país a cada ano anda entre os 3 e os 4%. Mas se a dívida pública atingir ou
ultrapassar o aparentemente fatídico nível de 90% do PIB, a economia estagna, e
o crescimento médio é apenas de 0,1%. A alta dívida pública provoca a recessão.
Num mundo em que
os bons e velhos modelos económicos parecem desadequados e inúteis (e apenas
parecem, porque na realidade têm previsto e explicado muito bem as agruras por
que passamos, apenas seria necessário saber ler...), uma análise pouco
convencional, com um resultado extremo e que tão bem aproveita os ventos
uivantes da austeridade cega só poderia estar destinada ao sucesso mediático.
Nos últimos três anos, o tal papelzinho foi citado como justificação por todos
os arautos do neoclassicismo económico no poder: de Schäuble a Rehn, de Osborne
a Ryan, de Gaspar a Carlos Costa... ou se preferirem, o BCE, a Comissão
Europeia, o FMI, os governos inglês, alemão, neerlandês, português, o Banco de
Portugal, etc., todos juntos, em uníssono, a clamar pelos cortes e pela
austeridade redentora, porque “Reinhart e Rogoff provaram que se devermos mais
de 90% não crescemos”.
Na semana
passada, o estudo foi desacreditado, mais, foi demolido por outros economistas
(da Universidade de Massachusetts) que lhe apontaram três erros fatais:
primeiro, os dados apontam naturalmente para uma conclusão invertida, já que é
a recessão (que provoca menor receita e maior despesa ao Estado) que provoca o
aumento da dívida, e não o contrário; segundo, não tinham sido
inexplicavelmente incluídos países com altos crescimento e dívida (que contrariavam
portanto a conclusão que se desejava atingir); e em terceiro – quase como o
toque final de tragicomédia – os dois economistas tinham-se enganado ao inserir
os dados na folha de cálculo Excel e excluíram vários países do resultado final.