Poucos livros em toda a Literatura mundial terão um início tão conhecido como “História de Duas Cidades”, escrito no longínquo ano de 1859; mesmo muitas pessoas que não conhecem o título do livro, ou nunca leram Dickens, reconhecem com um frémito as seminais linhas de abertura do romance – e isso é ainda mais verdade no caso da versão original inglesa: “It was the best of times, it was the worst of times...”.

Nos Estados
Unidos, de 2009 a 2011 – os anos da grande crise e também do início da
recuperação, já que os EUA não seguem à risca a receita suicida da austeridade
– os rendimentos médios nominais de 99% da população desceram. Mas os
rendimentos dos 1% que já tinham os maiores rendimentos aumentaram em 11,4%, um
pouco em linha com os lucros das grandes corporações americanas e o maior índice
da bolsa da Nova York, ambos actualmente nos seus máximos históricos. Como
também o está a taxa de desemprego, que teima em não descer – o que terá
certamente algo a ver com a facto de não haver muitas empresas a contratar.
Há um ano, a OCDE
apresentou um relatório curioso: “Divididos nos mantemos”. Aí se apresentava um
quadro absolutamente negro do aumento da desigualdade, em duas décadas, em todo
o mundo considerado desenvolvido (honrosa excepção feita ao Brasil), e como
isso estava a criar problemas em todas as sociedades. Voltemos aos EUA: a
desigualdade de rendimentos entre americanos só em 1928 tinha sido tão alta
como em 2007. Ou seja, precisamente os dois anos anteriores às duas maiores
crises financeiras da civilização moderna.
Saltemos para Portugal,
a terra da desigualdade. O país da OCDE onde os indicadores de desequilíbrio
(entre a pequena percentagem que mais rendimentos obtém e a maioria silenciosa
que se sente mais e mais cercada) são dos mais elevados, logo abaixo da
Turquia, do Chile e do México. E dos EUA, cuja forma de organização da
sociedade copiamos, pelo menos nos aspectos mais nefastos. Como na redução sem
limites dos custos do trabalho ou de políticas económicas redistributivas.
Estas constatações não se tratam de um ataque a quem mais ganha, só que a desigualdade queima: destrói a confiança, as liberdades, a prosperidade da sociedade. E também nos vai corrompendo moralmente, até que a indignação por um mundo cada vez menos bom se reduza a um espasmo envergonhado.
Estas constatações não se tratam de um ataque a quem mais ganha, só que a desigualdade queima: destrói a confiança, as liberdades, a prosperidade da sociedade. E também nos vai corrompendo moralmente, até que a indignação por um mundo cada vez menos bom se reduza a um espasmo envergonhado.
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