quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Talassoterapia

O corpo é apenas a jaula do espírito, mas é uma jaula que exige manutenção cuidada devido a todos os maus tratos que lhe damos ao longo do ano. E este último ano, sabemo-lo todos, tem sido duro. Às pressões e solicitações crescentes da vida quotidiana adiciona-se um enquadramento societal cada vez mais exigente e complexo – dito de outra forma: o mundo em que vivemos não está fácil. O nosso modo de vida – “nosso” dos portugueses, nosso dos europeus, dos ocidentais, dos humanos – está ameaçado por forças tectónicas e divergentes. Seja por trabalharmos pouco ou por trabalharmos demasiado, por consumirmos de menos ou demais, por sabermos pouco ou mal, por sermos demasiados ou por não sermos em número suficiente; de uma forma ou de outra se vai criando uma nova normalidade no nosso bem-estar que é certamente diferente, provavelmente pior que aquela a que estávamos habituados. Na verdade, talvez nunca como hoje a própria noção de “progresso”, em que as nossas vidas tenderiam sempre a melhorar à medida que fôssemos caminhando para velhos, e em que os nossos filhos teriam possibilidades que nós não tínhamos tido, esteja tão ameaçada. E a revolta contra este estado de coisas, sejam os défices privados pagos pelo público, a robotização do emprego (quando ele existe), o declínio do poder de compra, o fim do euro ou a deterioração do ambiente é real. E até está na rua. Por vezes mistura-se com preocupações etéreas e no entanto ainda mais graves, como atentados terroristas na Noruega, terramotos e tsunamis nucleares no Japão, ou três guerras (Iraque, Afeganistão, Líbia) em que estamos envolvidos mais directamente. É. Está a ser um ano difícil.

A solução? O mar. “O mar?”, perguntará o leitor incrédulo, parafraseando Paulo Portas ao tomar posse em plenos Jerónimos na sua primeira encarnação como ministro da Defesa e do Mar. Sim, o gigante azul que é a fonte de vida neste
planeta.

A talassoterapia (vinda da palavra grega para mar, thalassa) é uma ciência inexacta, cujos efeitos sobre algumas maleitas são dúbios; não é o caso no entanto dos efeitos benéficos na pele, que são visíveis e imediatos, o mesmo sendo válido para problemas respiratórios ganhos após meses de poluição, fuligem e frio em climas agrestes. Alegadamente, a terapia com água retirada do mar também regenera ossos, pulmões, coração (físico, não metafórico), nervos, sistema digestivo, glândulas, sangue...

O que nos interessa aqui são os benefícios sobre o espírito. Proponho-lhe uma experiência: para ela vai precisar de um mar – qualquer mar, mesmo a cinzenta versão da costa belga, mas alguns são melhores que outros. O ideal para o caso é o mesmo o verdadeiro: o mar oceano, o Atlântico, aquele que nos moldou a História e banha a ocidental praia lusitana (a versão acalmada da costa sul do Algarve já não serve tão bem), o mar em todo o seu esplendor agreste, com altas ondas e muito frio. Ganhe coragem e entre; nade, mergulhe, salte nas ondas. Submerja-se. Ao sair de volta à toalha, estará revigorado, rejuvenescido, esquecido de papéis e contas, pronto para mais um ano de preocupações. Energético e feliz. Ah, se ainda não for suficiente, repita a dose q.b. E boas férias.