“Quem
tem medo do lobo mau, do lobo mau?” cantam os Três Porquinhos da Disney num
filme de 1933 (este ano representa também uma coincidência – mas já lá vamos). Apetece
dedicar a música do filme ao Syriza, o partido de verdadeira esquerda que acaba
de vencer as eleições no país-berço da democracia. O coro de ameaças e
alarmismos da Europa austeritária (e autoritária) sobre o suposto perigo que um
partido anti-troika consistiria se chegasse ao governo juntou todos os nomes
habituais, como Merkel, Cameron e Hollande, a outros como Juncker – cuja própria
posição de presidente da Comissão Europeia, o órgão que defende o interesse
comunitário e assegura a igualdade de tratamento de todos os Estados, o
aconselharia a evitar imiscuir-se na campanha eleitoral afirmando que “preferia
ver caras conhecidas” no governo grego. “Cuidado com os extremismos”, disse o
luxemburguês na Grécia apenas um mês antes do voto.
Só
que, talvez ajudado por esses mesmos avisos, o lobo Syriza ganhou mesmo,
finalmente. Escrevo “finalmente” por dois motivos: porque esta vitória é
importante; e porque chega com grande atraso. Sobre o atraso, já falei várias
vezes aqui – a crise “explodiu” em 2008 e a resposta europeia foi sempre a errada.
A Grécia, em particular, foi escolhida para servir de exemplo – e é agora um
símbolo doloroso do falhanço total das políticas autoderrotistas. Constituiu-se
à pressa um sindicato de credores que exigiram condições humilhantes ao país,
delineadas no famoso memorando de Maio de 2010 que ficará para sempre como um
tratado de fantasia económica, um embuste épico que se travestia de “realista”
e “responsável”. Prometia-se que, seguindo a receita “sem alternativa” de
punições e cortes selvagens, a Grécia só sofreria uma ligeira contracção em
2011 para voltar ao crescimento já em 2012; e que o desemprego, sim, subiria
até aos 15% em 2012 mas desceria rapidamente depois disso.
A
realidade foi (é) inevitavelmente outra. A Grécia desceu ao Hades, numa
depressão económica ao nível dos anos 30. Tal também se traduz em números,
embora estes não cheguem para dimensionar o pesadelo: cinco anos de recessão em
que o país perdeu um quarto da sua riqueza; 28% de taxa de desemprego, que
chega a 60% no desemprego jovem; milhões de pessoas sem acesso a cuidados de
saúde. A economia parou de cair, mas continua estagnada, e sem perspectivas de
recuperação num futuro razoável. Ah, e a dívida tornou-se muito maior,
naturalmente impagável.
Aquando da Grande
Depressão, Roosevelt e Keynes iniciaram a recuperação ao fim de quatro anos –
ou seja, no tal ano de 1933. Grosso modo, foi o mesmo tempo que Obama levou a
lançar o seu programa de estímulos que faz com que os EUA já olhem a crise pelo
retrovisor. Mas na Europa já passaram sete anos, e continuamos a cavar o buraco
mais fundo. Independentemente dos méritos que o Syriza venha a ter enquanto
governo – provavelmente poucos –, a vitória democrática (sublinhe-se) de uma
solução alternativa e, isso sim, mais realista é importante pelo que pode vir a
significar para o rumo económico de um continente que caminha para uma “década
perdida”. Há muito que era necessário renovar o ar bafiento que se vive na
nossa Europa; os gregos acabam de abrir uma janela, resta aos espanhóis e aos
portugueses abrirem agora mais portas.