quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Milagres de Natal? Só nos filmes

Natal não seria Natal sem a oferta específica de filmes que se adequam à quadra. Em Dezembro, as programações das tv e cinemas intensificam a sua oferta de histórias redentoras cheias de animação, heróis e efeitos especiais; por exemplo filmes da série Harry Potter, Madagáscar ou Shrek são incontornáveis (já o meu lado romântico inclina-se mais para clássicos como “Casablanca” ou “Do céu caiu uma estrela”, de Frank Capra).

Na Hungria não é diferente, e como tal, na véspera de Natal de 2009, um húngaro senta a sua filha Lola ao colo e ambos preparam-se para assistir a “O Pequeno Stuart Little”, uma comédia sobre um ratinho branco que é adoptado por uma média família americana. O filme é divertido e Gergely Barki, um investigador na Galeria Nacional, disfruta dos pacíficos momentos em família. Mas de repente dá um tal salto no sofá que quase atira a criança ao chão: no ecrã acaba de vislumbrar um quadro perdido há mais de 90 anos. Está ali, no filme, ao fundo da sala de estar, logo atrás do ratinho branco e dos actores Hugh Laurie e Geena Davis! Um quadro que se pensava destruído e do qual o investigador só conhecia uma foto a preto e branco tirada em 1928…


Gergely foi comprar o filme assim que pôde, para comprovar se os seus olhos não alucinavam. Quando percebeu que o quadro no filme era mesmo “Mulher Adormecida com Vaso Negro”, de Robert Bereny (um pintor vanguardista dos anos 1920 na esteira de Kandinsky ou Fernand Léger), o investigador desatou a escrever emails para todos os que pudessem estar relacionados com o filme: o estúdio, a Sony Pictures, a Columbia Pictures, até os actores. Sempre sem resposta.

Até que, dois anos mais tarde, o desejado email aterra na sua caixa de correio: a cenógrafa do filme responde: “sim, tenho o quadro desaparecido em minha casa”. A reconstituição do circuito do quadro não resolveu todo o mistério, apenas os últimos passos: comprado pela cenógrafa numa loja de antiguidades da Califórnia, onde tinha chegado vendido por um homem que o tinha encontrado – custou-lhe 32 euros – numa venda de caridade católica, coincidência que contribui para pintar o curioso quadro de milagre de Natal. E agora, à laia de epílogo, o quadro foi no sábado leiloado em Budapeste (por 250 mil euros). Mas o porquê de ter desaparecido por quase um século, isso nunca saberemos.

No tumulto do século XX europeu, repleto de guerras, revoluções e extremismos, perdeu-se muito – incluindo incontáveis objectos preciosos. Tal como o elegante “Mulher Adormecida com Vaso Negro”, muitas outras obras-primas estão desaparecidas para sempre, espalhadas pelo mundo. Por vezes aparecem como filão, o que aconteceu num apartamento pertencente a um velhote alemão no ano passado; outras vezes, é precisa uma improvável combinação de um filme de Natal, um ratinho branco e um pai babado com olhos de lince.

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