Haveria certamente uma dose de ironia nas palavras de Camus. Mas este desporto, o único verdadeiramente global, encerra outras qualidades e a mais extraordinária é a capacidade de mimetizar a realidade. Dito de outra forma, podem estabelecer-se paralelismos futebolísticos com as mais diferentes disciplinas. Por exemplo, o mercado único europeu nasceu devido à crescente incapacidade dos mercados nacionais fragmentados em permitir a melhor prosperidade das suas populações. Eliminando fronteiras e barreiras, os 27 compartimentos estanques nacionais passaram a um só, com muito maior potencial (e este é um processo ainda longe de terminado, mas isso ficará para outra crónica).
O futebol europeu também caminha inexoravelmente para uma forma de campeonato europeu que substitua, para os grandes clubes que nele participarem, as cada vez menos competitivas ligas nacionais. Nestas, o fosso entre os dois ou três verdadeiros contendores e os restantes é agora enorme, e não pára de aumentar: só na semana passada, em Inglaterra, as duas equipas de Manchester (actualmente as mais ricas) esmagaram por 8-2 e 5-1 as equipas que terminaram em quarto e quinto na última época, Arsenal e Tottenham. E isto é numa liga onde os direitos televisivos são negociados em conjunto e distribuídos de forma equitativa; onde não são, em Espanha, duas equipas gigantes passam o ano à espera de jogar uma contra a outra. Barcelona e Real Madrid abocanham 75% das receitas do futebol em Espanha; os dois juntos só tiveram cinco derrotas em 130 jogos; e o fosso do segundo para o terceiro, o Valencia, foi de 21 pontos... a mesma distância entre primeiro e segundo em Portugal, com o FC Porto a terminar um campeonato quase só com vitórias e 36 pontos à frente do terceiro lugar, o Sporting. Em Itália também parece só haver dois candidatos crónicos ao título (Inter e Milan); em França e na Alemanha, a competitividade no topo da tabela só parece maior quando Lyon e Bayern Munique, respectivamente, se distraem e têm um ano mau.

Se quiserem lutar o quanto antes por um lugar entre a elite, FC Porto, Benfica e Sporting devem capacitar-se que Superliga Europeia não demorará mais de alguns anos. E que os lugares para Portugal não estão reservados de antemão.
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