O problema é que a parte mais afastada da realidade na frase “A Europa elege o seu primeiro presidente” é mesmo o início. Não serão os cidadãos europeus a eleger o “seu” presidente. Na verdade, é difícil até identificar quem o faz; em teoria, são os 27 governos dos Estados-Membros, mas na verdade apenas uma ou duas pessoas influenciam a escolha dentro de cada governo, e o peso de cada um dos 27 também é muito diferente… Olhando de perto, o futuro mandatário por dois anos e meio (renováveis uma vez) será escolhido por 10 ou 20 europeus entre os cerca de 500 milhões que habitam esta “casa comum”. Para a causa do envolvimento dos cidadãos no grande projecto europeu, a conclusão não é brilhante. Porque não, por exemplo, eleger um certo número de candidatos, digamos 12, em eleições verdadeiramente pan-europeias, sendo posteriormente um desses 12 magníficos escolhido numa cimeira extraordinária como aquela que decorre amanhã em Bruxelas? A força e legitimidade da Europa sairiam reforçadas e essa grande invenção europeia denominada “democracia” seria mais honrada do que na situação actual, com nomes cozinhados atrás de portas fechadas e nos quais os media vão tentando acertar (ou criar), enquanto a maioria da população passa tranquilamente ao lado de mais uma decisão com impacto real na sua vida.
Quanto impacto? Depende de quem for eleito. Os jornais apontam o primeiro-ministro belga, Van Rompuy, como grande favorito – e o que não deixa de ser interessante, desde domingo que nos famosos bookmakers ingleses já não é possível apostar no próximo presidente, o que indica que o favorito é mais do que isso. Van Rompuy, que tem “Aquiles” no seu nome completo, tem o calcanhar de ser um perfeito desconhecido até há um ano atrás, quando foi designado para pacificar o seu difícil país. A sua eleição significará uma Europa introvertida e um cargo desenhado essencialmente como facilitador de consensos. Juncker, outro candidato, vem de um país que é mal visto devido ao segredo bancário, e detém uma característica que deveria ser uma vantagem mas infelizmente não é: a imagem “demasiado europeísta”. Para os resultados de corridas tão incertas e em que muitas vezes surge um nome inédito à última hora (que o diga Barroso) aos dois postos – também o de Alto-Representante da União para a Política Externa –, eu arriscaria apenas dois prognósticos: o presidente virá de um pequeno país da Europa do Norte; e um dos dois cargos será entregue a uma mulher.
A data de 9 de Novembro é hoje um dos símbolos da reunificação europeia e, passados 20 anos, a grande cidade que é Berlim tenciona festejá-la condignamente. No fim-de-semana que passou foram os envelhecidos líderes políticos daquele tempo, Helmut Kohl, Mikhail Gorbatchov e George Bush pai (Mitterrand morreu e Thatcher tem Alzheimer em estado avançado), que posaram para uma fotografia de grupo; no dia 9 são os seus respectivos sucessores a fazê-lo. Mas a festa vem também para a rua: no dia 5, os U2 – cuja carreira é indissociável de Berlim – tocam na Porta de Brandenburgo. Depois há exposições, desfiles, fogos-de-artifício, concertos, tudo inserido num tão relaxado quanto ambicioso “Festival da Liberdade” que vai transportar os presentes de volta àqueles dias onde a História andou muito depressa, e onde a “ilha verde” que é a cidade de Berlim, 8 vezes mais extensa que Paris, voltou a ser o centro do Mundo.