terça-feira, 14 de julho de 2015

Siiiiim!


Na Grécia, há um dia do Não. Cada 28 de Outubro é feriado, e todos os locais públicos são engalanados com bandeiras azuis e brancas. Os gregos relembram o dia de 1941 em que o primeiro-ministro grego foi acordado de madrugada e confrontado com um ultimato de Mussolini, que exigia o controlo imediato das áreas estratégicas da Grécia ou invadiria o país. A resposta em bom francês de Metaxas – “alors, c’est la guerre!” – ficou na História como, simplesmente, “Não!”. O exército grego acabou por rechaçar os soldados italianos, mas em seguida vieram as divisões nazis, que içaram a bandeira com a cruz suástica na Acrópole poucos meses depois. (Esta bandeira viria a ser retirada por resistentes gregos, um dos quais, Manolos Glezos, é hoje aos 92 anos deputado europeu eleito pelo Syriza).

A resposta de Metaxas era o Não mais célebre de sempre… até domingo passado, quando um povo – exangue, submetido a um tratamento de choque neoliberal ao longo de meia década, chantageado por decisões discriminatórias do Banco Central Europeu, ameaçado por uma fila interminável de políticos europeus a quem a fina camada de verniz democrático estala com demasiada facilidade, esfomeado pelos bens que começam a escassear – não se intimidou e gritou de forma avassaladora “Não”. Não a mais curas suicidas. Não a mais políticas austeritárias que já foram testadas e comprovadas como falhanços perigosos ao longo da História.

A revista “Der Spiegel”, num excelente artigo publicado um dia antes do referendo, chama ao ponto a que chegamos “as cinzas de Angela”. O estilo de liderança da chanceler – adiar, esconder, permitir que tudo permaneça vago, nunca tomar decisões impopulares para os seus eleitores – talvez funcione na política doméstica alemã, mas é um desastre quando as responsabilidades são maiores. E sob Merkel, a Alemanha procura efectivamente reinar sobre a Europa – mas não sabe o que fazer com esse poder. “A crise grega requeria liderança e um plano, mas Merkel foi incapaz de fornecer nenhum dos dois”, escreve a publicação alemã.

Um “Sim” no referendo, além de fazer cair o governo actual (genuinamente europeísta) e talvez abrir caminho para os populismos neofascistas, teria condenado a Grécia a anos (décadas?) adicionais de sofrimento (punição?) às mesmas políticas que diminuem o PIB ainda mais rápido que cortam a dívida, ou seja, piorando os problemas. Mas um claro “Não” abre uma janela de oportunidade que é absolutamente necessário aproveitar – já não para salvar a Grécia, mas sim o próprio projecto europeu, há demasiado tempo prisioneiro do “pensamento único” e dos egoísmos nacionais.

É simbólico que muito do que estava em jogo tenha sido entendido pela juventude grega, percentualmente a faixa da população que mais votou “Não” (sobretudo os mais jovens, alguns a exercer o seu primeiro voto de sempre). A taxa de desemprego entre os jovens já ultrapassa os 55%; a esmagadora maioria não pode, talvez nunca venha a poder, sair de casa dos pais e começar a caminhar na vida. É toda uma geração que está a ser desperdiçada pela Europa, e sobretudo na Grécia, em nome do pagamento de juros altíssimos a bancos alemães e franceses…

O voto “Não” foi na verdade um voto “Sim” – sim a outra Europa, a Europa da coesão, da solidariedade, do crescimento, da esperança, enfim, da racionalidade económica. Sim à Razão, sim a uma conferência da dívida entre devedores (Portugal incluído) e credores. Sim a um Acordo Justo.

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