terça-feira, 4 de outubro de 2011

As nuvens adensam-se


"Deito-me a sonhar com a próxima recessão global, aquela onde milhões de pessoas perderão os seus empregos e as suas casas. Aconselho toda a gente a proteger os seus activos, porque eu penso que as poupanças de muita gente desvanecer-se-ão em a 12 meses. Os governos não vão poder salvar-nos, e as grandes instituições estão a vender os seus euros porque esta moeda vai-se afundar". Quem fala assim não é gago, sobretudo se o fizer na BBC e for apresentado como "um dos deles" (ou seja, um dos donos do mundo): mas Alessio Rastani é um corretor da bolsa menor, um zé-ninguém financeiro que surpreendeu e dividiu o mundo com os seus 3 minutos e meio de fama, na semana passada. Rastani, com o cabelo cheio de gel e o seu ar ligeiramente vampiresco, acertou em cheio nos nossos nervos doridos e tornou-se imediatamente uma estrela de jornais e YouTube, sobretudo após ter lançado em desafio: "É a Goldman Sachs [banco de investimento americano] que governa o mundo. Não são os governos".

O homem que saltou para o estrelato ao dizer publicamente, com ar cândido e desassombrado, o que muitos pensam começou rapidamente a ser desacreditado por todo o tipo de teorias conspiratórias e cada um de nós pode comprar a sua favorita - desde tratar-se simplesmente de um humorista satírico até à possibilidade de estar a soldo de um grupo poderosíssimo que aposta precisamente no desfecho contrário ao preconizado por Rastani, que servirá assim para o desacreditar... Como nestes casos a regra é que a explicação mais simples é também a mais provável, prefiro pensar que um tipo anónimo decidiu aproveitar ao máximo a sua oportunidade de aparecer na tv e ficar conhecido na praça, misturando cenários catastrofistas com uma dose de iconoclastia. E também é legítimo dar voz às "frinchas" do mercado, porque em todas as situações existem sempre aqueles que jogam contra a corrente por mais forte que ela esteja - e por vezes são estes "salmões" quem tem mais razão. Mas tudo isso é até secundário, porque o relevante é que se Alessio Rastani consegue jogar com os nossos medos colectivos, é porque eles se podem mesmo tornar realidade, numa espécie de profecia que se auto-realiza.

Rastani é aliás um cordeirinho comparado com algumas vozes preocupadas e preocupantes no mundo financeiro. Attila Szalay-Berzeviczy, um húngaro de nome já de si assustador, antigo presidente da Bolsa do seu país, prevê "uma bancarrota grega que vai ter o efeito de um terramoto de magnitude 10... o país vai deixar de pagar salários ou pensões, as caixas Multibanco vão esvaziar-se em questão de minutos... depois segue-se o efeito dominó para outros países... o mesmo cenário, o desmembramento da zona euro e da Europa em questão de dias... em outras palavras, bem-vindos ao Apocalipse".

O preço do ouro não pára de subir. O mercado da arte parece imune à recessão. Os líderes mundiais correm em círculos como galinhas sem cabeça. A Goldman Sachs anunciou os seus melhores resultados operacionais em muitos anos. As nuvens adensam-se.

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