sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

E o Porto aqui tão perto

Tem o leitor vontade de desligar o mundo? Eu por vezes tenho. Bombardeado constantemente por más notícias, a crise, a dívida, o desemprego, o défice, a incerteza, as tensões, as repressões, as guerras, as crueldades, a decadência real ou percebida... Mesmo a minha irrequietude inata percebe que por vezes o melhor é descansar, ignorar jornais e internet, e funcionar em circuito fechado por uns tempos. Até que surja um daqueles raros momentos mediáticos que nos reconcilia com o Quarto Poder (a comunicação social) e parece reequilibrar os nossos valores.

Na semana passada aconteceu um desses momentos, cortesia do melhor jornal do planeta (sim, mesmo um pouco melhor que este em que lê estas linhas). Chama-se New York Times e publica, todos os domingos desde 2002 na sua edição em papel (e alguns dias antes online), uma coluna de viagens intitulada "36 horas em...", escolhendo falar dos pontos altos de uma cidade sob a forma "escapadinha de fim de semana". As cidades escolhidas costumavam ser americanas ou canadianas - a editora Taschen acaba aliás de publicar em livro uma deliciosa compilação de 744 páginas sobre estas expedições por toda a América do Norte -, mas estende-se agora a qualquer ponto do mundo, desde que este esteja "a acontecer". Era inevitável, portanto, que a escolha recaísse mais tarde ou mais cedo sobre o Porto, porque algo de especial se está a passar no velho e orgulhoso burgo.

Com uma longa história de rebeldia perante a injustiça a falar por si, de alma iminentemente liberal e carácter independentista, o Porto cansou-se de esperar por ajuda. Confrontado com mais um regime político que o ignora, exangue pela destruição do tecido industrial e empresarial da cidade e da sua região, a cidade virou-se para novas plantações que começam a dar os seus primeiros frutos: a explosão das "indústrias criativas" criou novos públicos, novos pólos de interesse e de criação de riqueza, e voltou a colocar o Porto no mapa - pelo menos no mapa do New York Times. Não menos importante que isso, a cidade está a voltar a tornar-se um lugar estimulante onde viver. Para turistas, então, está lá tudo: cultura, arquitectura, diversão, comida, calor humano e climático. Tudo com um selo genuíno que encanta o visitante apanhado desprevenido, como se nota numa das sugestões da coluna: uma visita não apenas ao mercado mas também à Manteigaria do Bolhão, que vende presunto a 9,5 euros o quilo, é encadeada com opções que mostram a nova face da cidade, como os designers de Miguel Bombarda ou a vanguarda da Casa da Música e da Fundação de Serralves. Nem sequer falta a referência ao novo Hard Club ou a novíssimos bons restaurantes literários, num texto que apesar de escrito por um americano a viver em Paris demonstra um conhecimento de causa invejável - mesmo maior que o de alguns residentes na cidade. E as 17 fotos que compõem o artigo são um deleite para os olhos...

Sem dúvida uma contribuição para o engrossar do número de visitantes da maior cidade do Noroeste da Península. Isto, claro, se eles conseguirem chegar ao Porto; para tal é necessária a persistência de encontrar um voo entre as reduzidas possibilidades disponíveis e a capacidade (e vontade) de pagar por esse voo um valor inflacionado. Nós, passageiros frequentes e natalícios, bem o sabemos.

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