quarta-feira, 21 de novembro de 2012

A Europa prefere Obama, mas vota em Romney

Conheço muitos europeus que se interessam por política, mas muito poucos entre eles teriam preferido Romney a Obama como vencedor das eleições americanas. Tal não é surpreendente, a acreditar nas sondagens “mundiais” publicadas pela BBC ou a MSN; por exemplo esta última analisou 35 países ou áreas geográficas, num total de 570 mil pessoas, e em quase todos Obama foi declarado vencedor virtual com resultados absolutamente esmagadores. O único país em que “perderia” seria curiosamente a China, um país formalmente comunista onde Romney obteria 52% das preferências. Do outro lado do espectro está Portugal, onde Obama obteria uns quase ditatoriais 94%; em Espanha 84%, na Alemanha 92%, em França 88%, no Reino Unido 85%... a BBC corrobora estes resultados, temperando-os com alguma abstenção, e dá ao Paquistão (o país onde Osama Bin Laden foi assassinado por marines) o privilégio de se destacar como o único onde Romney poderia prevalecer. Mas entre os dois nem hay color, como dizem os espanhóis; se todo o planeta pudesse votar nas eleições americanas, Obama nem teria de sair do sofá para fazer campanha. E o seu maior feudo eleitoral estaria precisamente na Europa, que votaria em massa no partido Democrata.

A ironia aqui contida parece-me evidente e é de monta: quando chamados a escolher sobre o seu próprio destino, os europeus escolhem sistematicamente os seus Romneys. Não quero com isto dizer que ao mesmo tempo rejeitem os seus Obamas, dado que não existem no Velho Continente políticos inspiradores ou com carisma similar ao do reeleito presidente americano. Afirmo sim que, com apogeu em Dezembro de 2011 (altura em que, dos 27 da União Europeia, apenas 4 pequenos países não eram governados por membros do Partido Popular Europeu) a liderança europeia na última década pertence resolutamente à família política conservadora do partido Republicano – e as semelhanças estão também nas questões sociais, mas sobretudo em opções financeiras, fiscais e económicas. E foram essas mesmas opções que, nos EUA, transformaram os anos de bonança da era Clinton em anos deficitários com George Bush, e na Europa nos atiraram para um buraco do qual estamos a tentar escapar escavando mais e mais fundo.
Romney (e o seu parceiro candidato a vice-presidente, Paul Ryan, que representa uma autêntica versão americana do ministro português das Finanças) propunha várias medidas que o que incluiam cortes de impostos para os mais ricos e as empresas, mas também o equilíbrio do défice como prioridade – cortando brutalmente na despesa pública - e menos regulação da economia, além de aumento da idade da reforma, desmantelamento do sistema público de saúde ou o endurecimento das leis sobre imigração. Provavelmente tudo isto soa familiar, já que é esta a receita que temos aplicado deste lado do Atlântico, sendo por isso recompensados com o quinto ano consecutivo de recessão (em Portugal) ou de crescimento anémico (na zona euro). Esta semana chegamos mesmo a um ponto quase caricato: o FMI a aconselhar uma inversão das políticas de austeridade, e a Comissão Europeia a pedir mais da mesma – e sem a devida compensação necessária do lado monetário (simplificando, a impressão de mais moeda), porque a Alemanha assim não permite, mantendo-nos assim presos numa reedição do ano 1930. Nessa época, a meio da Grande Depressão, Keynes escreveu: “Os tempos de crescimento, e não os de depressão, são os indicados para a austeridade”. Nos Estados Unidos, há quem o saiba, e há sinais claros de que o pior já ficou para trás; a Europa aplaude, mas continua nas mãos de Romney.

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