terça-feira, 7 de junho de 2011

A não-escolha


Portugal organiza este domingo as suas eleições legislativas mais paradoxais de sempre.

Por um lado, o país atravessa uma crise financeira que já se está a tornar - na verdade, tal já começou há muito tempo, mas ainda vai piorar bastante - uma crise económica. Há um cinismo instalado que, misturado com a incerteza sobre o futuro e a ausência de rumo para o presente, torna o momento particularmente delicado. Por muito que possamos discutir a decrescente influência que a escolha de um ou outro governo venha a ter nas nossas vidas, a verdade é que as escolhas não são indiferentes e terão, neste caso, repercussões sobre os anos vindouros.

Essa é a teoria. Mas a prática está num plano radicalmente diferente. O nosso sistema democrático deixou-se enredar nas suas imperfeições: hoje, em Portugal, não são os melhores, os mais capazes, os mais visionários a concorrerem aos cargos políticos de maior responsabilidade do país. Não são os mais ideólogos, mas sim os que melhor dão a impressão de agradar a todos. Não são os mais brilhantes, mas os mais fotogénicos; não são os mais convictos, mas sim os que melhor defendem as federações de interesses em que se transformou o seu outrora grande partido.

Segura deste sistema, partidocracia que desvirtua a democracia regurgitou, para esta ronda de votos potencialmente importante, uma escolha aparente particularmente malsã. Sim, em teoria há 19 partidos inscritos no Tribunal Constitucional nos quais votar; sim, em teoria cinco destes devem eleger deputados ao parlamento; sim, em teoria não votamos em pessoas mas sim em partidos que a posteriori, representativamente, vão dividir uma assembleia da qual emanará um governo. E no entanto... sabemos que o próximo primeiro-ministro será uma de duas pessoas. E nenhuma delas reúne os mínimos recomendáveis para a função.

De um lado, o actual ocupante do cargo, rosto mais visível de anos de desorientação crescente, disparo da dívida e centralismo lisboeta asfixiante que culminaram na humilhação actual - um orgulhoso país a pedir dinheiro que lhe é emprestado com contrapartidas de verdadeira usura (a pagar pelas gerações futuras) e sob a condição de aplicar medidas de austeridade que, fazendo mingar o bolo a repartir, ainda vão agravar o problema.

Do outro lado, o desafiante, desenhado para combater o actual ocupante na forma correcta de enfrentar as câmaras de tv, que é menosprezado pelos pesos-pesados do seu próprio partido (um deles, mais dado a mediatismos, escreveu que ele tinha "a biografia do nada"), não tem percurso político de grande relevo, tem demonstrado grande atrapalhação na gestão da crise desde a queda do governo e, acompanhado de nomes de péssima memória para a economia portuguesa como Eduardo Catroga ou Bagão Félix, preconiza velhas receitas com novas roupagens.

De facto, os portugueses merecem "melhor". Só que essa opção, no domingo, não está disponível.

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