terça-feira, 23 de outubro de 2012

O desporto mais avançado da Europa

Uma equipa da casa na liderança da partida, tranquila e confiante, apoiada por um público ruidoso e entusiasta que enverga as cores da equipa (vermelho); uma equipa visitante, vinda de muito longe, com pouco apoio nas bancadas (em azul), e em larga desvantagem no marcador devido a uma primeira parte desastrada. No relvado, os jogadores das duas equipas batendo-se com toda a dedicação. E a bola decisiva, já na recta final do encontro, a provocar uma comovente explosão de alegria.

Não se tratava de um jogo de futebol em Lisboa ou Londres. O desporto em causa é o golfe e a competição, jogada este fim de semana, é a sua mais extraordinária: a Ryder Cup. Organizada de dois em dois anos, a taça é especial por vários motivos – entre os quais o facto de, apesar de movimentar milhões em direitos televisivos e patrocínios, não conceder qualquer tipo de prémio aos jogadores. O mais incrível, no entanto, está mesmo naquelas cores envergadas pela equipa (que era este ano) visitante e pelos seus apoiantes: um azul-escuro polvilhado de estrelas douradas que quase faz lembrar... mas esperem... não pode ser... e no entanto... é mesmo! É a bandeira europeia, ouro sobre azul, aquela que é agitada freneticamente pela multidão – e mais extraordinário ainda, muitos daqueles que ostentam orgulhosamente as cores europeias são cidadãos britânicos, sempre tão prontos a considerarem-se fora do continente a que pertencem.

Tudo porque a Ryder Cup é a única competição desportiva onde a Europa compete com um “Team Europe” – e logo contra os Estados Unidos. Não apenas isso, como somos melhores: desde o início deste formato, em 1979 (curiosamente, também o ano das primeiras eleições para o Parlamento Europeu), a Europa perdeu 7 taças e ganhou 10. A última, no domingo, foi absolutamente épica e entrará na História do desporto, com uma recuperação de último dia absolutamente improvável e ainda por cima polvilhada com dramatismos adicionais – um dos jogadores europeus viu no seu iPhone a hora errada de início e só chegou a tempo de jogar graças a escolta policial; o discurso de incentivo à sua equipa de George W Bush no sábado à noite não parece ter resultado – a partir daí, os americanos perderam quase todos os seus jogos. Os golfistas europeus (de 9 países diferentes, e com Portugal a candidatar-se a organizar a edição de 2018), inabalados pelos gritos constantes de “U-S-A!” atirados pela multidão de Chicago, não nos deram apenas um motivo de orgulho inesperado: também voltaram a provar que as dimensões simbólica e afectiva do desporto são fortíssimas – e que já é mais que tempo para mais equipas pan-europeias competirem na arena global do desporto.

Poucos terão reparado no facto de que nos recentes Jogos Olímpicos uma Europa unificada a 27 teria contabilizado muitíssimas mais medalhas que os EUA, a China ou a Rússia, ocupando o primeiro lugar da tabela final e dominando na maior parte dos desportos. Um rápido exercício teórico permite desde logo perceber que uma Selecção Europeia seria a potência a bater em quase todos os desportos, desde o basquetebol ao atletismo (tirando as longas distâncias, feudo dos africanos), passando pelo voleibol ou a canoagem. Uma equipa europeia de futebol, então, seria imbatível e mesmo um desperdício por só poder conter 11: como escolher entre Casillas e Buffon? E quem jogaria com Ronaldo no ataque, Ibrahimovic ou Balotelli?

Somos, nós europeus, os melhores desportistas, mas não só: vivemos na maior economia do mundo (a Europa a 27), orgulhamo-nos de ter algumas das melhores cidades do planeta, e construímos as sociedades mais justas/menos injustas da História humana. Por vezes é fácil perder de vista o que atingimos no turbilhão de querer o tanto que falta atingir.

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