terça-feira, 8 de julho de 2014

Mais uma guerra perdida


O general alemão Carl von Clausewitz foi um dos maiores teorizadores da guerra e o estudo dos seus escritos é essencial em quaisquer estudos de diplomacia ou política, bem como naturalmente na carreira militar. Clausewitz reflectiu (e em muitos casos introduziu) variados conceitos hoje essenciais na “arte” do conflito, como por exemplo o “nevoeiro” que cada interveniente experimenta antes de pisar terreno inimigo e, assim, o conhecer. Ou a relação assimétrica entre ataque e defesa (sendo que esta última é, em princípio, a posição mais privilegiada sobre a qual guerrear).

Na cultura popular, Clausewitz é sobretudo conhecido pelo seu aforismo: “a guerra não é mais que a continuação da política por outros meios”. Ora, se a guerra é o prolongamento da política e o desporto não é mais do que a sublimação da guerra (sobretudo quando os desportistas usam simbologia nacionalista, como no Mundial de futebol), então o desporto é a continuação da política por outros meios. É por isso que “Portugal” nunca devia ter sido goleado pela “Alemanha”. E é também por isso que Angela Merkel estava na tribuna para ver este jogo – e precisamente este jogo, não contra os EUA ou o Gana, pois estes países não estão sob a influência política e económica directa da Alemanha.

Política, económica, simbólica e psicologicamente, teria sido importante ter ganho à Alemanha; não por acaso, a maioria dos europeus neutros estavam em princípio a torcer por Portugal. É um reconhecimento tácito da teoria do equilíbrio de poderes, da qual Clausewitz, mais uma vez, foi um dos principais teorizadores. Esta pressupõe “o ponto culminante da vitória” – a partir do qual os adversários, sentindo-se ameaçados, unem-se e reagem.
Como reagir? A coragem e personalidade dos políticos portugueses são nulas e nunca foi possível ouvir-lhes sequer uma tímida oposição às vontades da chanceler alemã. Na economia, sem crédito e com uma mão-de-obra que continua a esvaziar Portugal em busca de oportunidades, também não é possível competir. E uma guerra, então, só mesmo no domínio da loucura.

Resta o desporto. Será sempre possível bater a organização com recurso ao talento puro, e tocar o adversário onde mais lhe dói – no seu orgulho. Mas mais uma vez, a selecção nacional parece um repositório das piores características da lusa estirpe: em vez de uma meritocracia, em que jogam os melhores (e em que o poder está nas mãos dos mais capazes), em Portugal existem os clientelismos, os interesses especiais e as cunhas; não há concorrência e jogam sempre os mesmos, nem que tenham estado parados toda a época ou já não tenham a dinâmica necessária para a função. Pior, o verdadeiro poder está na sombra, detido por um agente de jogadores, não respondendo perante ninguém. Como se não bastasse, a preparação da competição é uma piada: a equipa andou a fazer amigáveis lucrativos nos EUA enquanto os alemães já se adaptavam ao calor e humidade numa estância construída de raiz para o efeito; quando finalmente chegou ao Brasil, Portugal foi notícia pela festa, pelo histerismo à volta de Ronaldo, mas sobre o objectivo – a vitória – falou-se sempre pouco. E depois claro, o futebol é um fenómeno colectivo e uma pseudo-equipa que tem uma hierarquia rígida, como a portuguesa, arrisca-se a ser goleada por uma máquina equitativa como a alemã. Não, claramente, assim não ganhamos.

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