domingo, 21 de novembro de 2010

“Portugal”. Uma obra-prima?

Talvez isso não tenha sido muito discutido na altura, mas Maio de 2010 foi um maná para a Arte na Grande Região. Em apenas uma semana daquele mês, a primeira, foram inaugurados dois museus, um deles bonito, o outro verdadeiramente magnífico. Mas ambos são espaços de visita e fruição que brilham mais intensamente durante um fim-de-semana chuvoso.

O museu bonito chama-se Villa Vauban e fica em pleno parque municipal do Luxemburgo. Claro, o edifício já existia – é uma bela villa urbana construída em finais do século XIX por uma rica família austríaca que fez a sua fortuna vendendo luvas – e até já servia, entre outras coisas, de museu, com quadros de Canaletto e Delacroix. A renovação profunda custou mais de 14 milhões de euros e quadruplicou o espaço de exibição, mas não melhorou a colecção; ainda assim, uma visita a uma sexta-feira à noite, com entrada grátis e aperitivos oferecidos, será sempre um plano interessante a partir de Dezembro, quando o museu reabrirá com uma nova exposição.

A outro nível, naturalmente (até orçamental – custou 70 milhões), encontra-se o novo Centro Pompidou de Metz, filial do famoso museu de arte moderna em Paris. O extraordinário edifício projectado pelo arquitecto japonês Shigeru Ban impressiona pela sua graça, cortesia de um telhado que parece moldável – a lenda diz que Ban se inspirou “num chapéu que encontrou numa loja de Paris” – e retira volume a um edifício de quatro andares. Metz, sonolenta cidade de província, é a mais recente a procurar o “efeito Guggenheim”, em que um novo museu-monumento é a ignição da mudança da face de uma cidade, como aconteceu em Bilbao.

O Pompidou Metz teve o privilégio de, para a sua exposição inaugural, escolher o que quisesse na extensa colecção (a maior de arte moderna na Europa) da casa-mãe em Paris, e percebe-se que os seus responsáveis se sentiram um pouco como o proverbial puto em frente à montra da pastelaria: quero levar aquele, e aquele, e mais aquele... o resultado é uma exposição sem coerência, cujo ténue conceito, sob o título “Chefs-d’Oeuvre?”, é o de analisar o conceito de “obras-primas” – se tal classificação ainda faz sentido, e também se ela é eterna. Pelo caminho, é possível ver algumas das obras que fizeram a História da Arte – e a exposição tem tido tanto sucesso que foi prolongada até 17 de Janeiro.

Em dado local do museu, ao longe, uma parede apresenta enormes formas coloridas que fazem lembrar mulheres com xailes e parelhas de bois. Uma peixeira leva uma canasta na cabeça. O título confirma os motivos familiares: “Portugal”, obra monumental (e gigantesca) de Sonia Delaunay. Fugindo à I Guerra Mundial, os Delaunay viveram por ano e meio em Vila do Conde em 1915, partilhando casa e vivência com Eduardo Viana, Almada Negreiros e o malogrado Amadeo de Souza-Cardoso, os grandes pintores portugueses da altura. Sonia Delaunay imortalizou “o período mais feliz da sua (longa) vida” naquele mural colorido. Uma obra-prima.

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