Jean Monnet, um dos
“pais fundadores” da Europa, usou por várias vezes a metáfora da bicicleta:
para ir em frente sem cair, a UE teria de estar a pedalar constantemente. E
Jacques Delors, um dos seus ilustres sucessores, teorizou sobre os “pequenos
passos” da construção europeia, que num mundo em constante mudança poderiam não
ser suficientes e exigir isso sim mudanças quantitativas.
Depois do imobilismo
de uma década de Barroso, a pergunta é legítima: qual foi a última vez que a
Comissão Europeia usou o seu poder de iniciativa para impulsionar uma ambiciosa
reforma? A resposta mais correcta será porventura a introdução do euro… em
2002. Há demasiado tempo.
Os primeiros meses
do team Juncker não foram promissores, trazendo o cancelamento de vários temas
que transitavam do passado sob o manto protector de uma anunciada intenção de
“legislar melhor” (ou seja, muito menos). Mas a semana passada trouxe uma boa
surpresa: sob uma pressão mediática terrível, com incessantes barcos de
migrantes vindos de África e uma opinião pública polarizada sobre o problema, a
Comissão adoptou a sua “Agenda para as Migrações”, mostrando que tem a
determinação e os recursos (inteligência, coragem, peso político) para (pelo
menos tentar) atingir os seus objectivos.
O plano apresentado
tem principalmente dois pontos-chave: acabar com o absurdo de 28 políticas
diferentes de migração e asilo num continente onde as fronteiras internas foram
suprimidas, e enquadrar ao mesmo tempo um fluxo migratório inevitável de que a
Europa, mesmo não o querendo admitir, tem necessidade. Mais do que isso: os
imigrantes que chegam em barcos, bem como os outros que entram de outras
formas, serão fulcrais para que no futuro esta parte do mundo se mantenha
competitiva, relevante… numa palavra: viva.
O desafio é enorme.
A Agenda obriga os Estados-Membros europeus a redistribuir o esforço de
processamento dos pedidos de asilo, que neste momento recaem sempre sobre o
Estado de chegada – ou seja, Itália, Grécia, Espanha ou Malta. E, de acordo com
uma fórmula que tem em conta a riqueza do país, a sua taxa de desemprego e a
sua população, estabelece uma quota de refugiados obrigatória por país – por
exemplo, Portugal deveria receber a cada ano 704 refugiados, enquanto que no
ano passado o país recebeu uns meros… 14.
O obstáculo reside
precisamente aqui. Juncker teve a coragem de iniciar um braço-de-ferro com os
Estados; estes, por razões que vão desde a falta de visão ao populismo egoísta,
não querem ser forçados a nada e já rejeitaram maciçamente a imposição de quotas,
ameaçando pela base todo o novo sistema, ao mesmo tempo que organizam uma
operação naval para destruir os barcos utilizados pelos traficantes na Líbia –
uma medida necessária, sem dúvida, mas muito longe de suficiente para resolver
a crise.
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