Este não é um
texto sobre desporto, que para isso há secções do jornal mais adequadas; é sim
sobre símbolos, marcas e percepções. O ponto de partida é a recente, ainda que
não surpreendente, quebra de contrato entre o português José Mourinho e o
“maior clube do século XX” (eleição da FIFA), o Real Madrid.

Vasco da Gama,
depois de se ter libertado da lei da morte deixando o seu nome para sempre gravado
na História, também teve os seus períodos mais humanos. Ao regressar da
primeira viagem à Índia, foi-lhe atribuída a sua pequena vila natal de Sines;
mas a sua administração como alcalde revelou-se muito pouco competente. Já
Mourinho no Real Madrid não foi um fracasso total: elevou os níveis
competitivos de um clube que andava a falar em “maldição dos oitavos-de-final”,
e venceu uma liga obtendo nada menos de 100 pontos (e contra o Barcelona). Mas
o gestor futebolístico de Setúbal, que até nem fica longe de Sines, entrou no
clube como o melhor treinador do mundo e sai apenas como um dos melhores,
desgastado, conflituoso, incompreendido, perdedor. E – o que seria uma novidade
– parecendo desorientado.
O profissional
Mourinho regressará ao topo. Mas para já, é merecedor de um bem-haja pela
enorme mais-valia que representa para a marca “Portugal” e todos os que dela
beneficiam – ou seja nós, portugueses. Para um país, produzir um ou dois
grandes jogadores de futebol não produz efeitos fora do desporto em si, até
porque grande parte do talento para jogar é inato (e logo, “fortuito”). Mas as
qualidades simbólicas transmitidas por um gestor como Mourinho são aquelas de
que mais necessitamos não só para valorizar o “Made in Portugal”, como mesmo a
um nível psicológico mais profundo, que pode vir a ser importante na forma de
lidar com os tremendos desafios individuais que cada um de nós enfrenta. José
Mourinho é um líder, e é atento, completo, meticuloso, ambicioso, inspirador,
corajoso, provocador, preparado. E muito seguro de si. Tanto que a sua
transbordante (auto)confiança é amiúde confundida com arrogância – mas
francamente, tão melhor estariam os portugueses espalhados pelo mundo, e tão
mais bem-sucedidos seríamos, se essa arrogância (sempre justificada, claro)
fosse nosso património comum.
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