quinta-feira, 20 de junho de 2013

Vamos lá então falar de electricidade

Este domingo realizaram-se eleições na Bulgária. Entre acusações generalizadas de batota eleitoral, o partido de direita que já estava no poder obteve uma maioria relativa. Um resultado surpreendente após o governo anterior ter caído em Fevereiro, empurrado por dramáticas manifestações que nas ruas gritavam “mafia!” e “demissão já!”.

O país mais pobre da UE entrou em convulsão social, não directamente devido à cartilha da austeridade (ali seguida à risca  - o Estado praticamente não tem défice, pagando isso com uma economia estagnada e uma população que tem de emigrar para poder viver dignamente), mas sim devido aos preços da electricidade. Estes são os mais baixos da Europa, mas neste país os salários são também os mais baixos da UE (em média, 400 euros; como mínimo, 159 euros por mês). Enraivecida pelo último aumento, conhecendo as obscenas margens de lucro dos operadores do mercado da electricidade, a população revoltou-se.
Felizmente para António Mexia e Eduardo Catroga, dois saudosistas dos regimes de antigamente, os portugueses constituem um povo muito mais manso que os búlgaros; se não o fossem, não aceitariam ser espoliados pela EDP que aqueles dirigem. A companhia monopolista em Portugal (79% da produção através participações nos concorrentes, e 99% da distribuição e comercialização) faz-se cobrar bem por uma das electricidades domésticas mais caras da Europa, mais cara que na Suécia, França ou Reino Unido, com o propósito confessado de “maximizar a criação de valor para os seus accionistas” (estes são principalmente chineses, havendo também bancos portugueses, argelinos...). Aparentemente tal não chega, porque a empresa acaba de ser condenada pela segunda vez em tribunal a reembolsar 105 mil clientes a quem cobrou demasiado, propositadamente e sem pudor.

E se as tarifas da EDP são altíssimas (permitindo a uma das empresas mais abastadas em Portugal projectar um segundo, e faraónico, “Museu da Electricidade” em Lisboa de forma a conseguir gastar algum do excedente), os impostos sobre a electricidade doméstica também o são. Isso permitiu ao Estado criar uma “entidade reguladora dos serviços energéticos” cuja missão é “proteger os consumidores em relação às tarifas” e “promover a concorrência entre os agentes intervenientes nos mercados” (está no sítio web da ERSE, sem nenhum smiley a denotar ironia). Este sonolento organismo pode não fazer muito, mas é pelo menos bom empregador: os seus administradores auferem 12 000 euros por mês e “continuam a receber 2/3 do salário, por dois anos, mesmo após cessarem funções” (está no Diário da República, também sem ironia).

O lucrativo e bem protegido monopólio da EDP ou o governo búlgaro que vence eleições suspeitas depois de ter caído nas ruas são duas faces da mesma sociedade-casino em que vamos vivendo: aparentemente há muitas “alternativas”... mas no fim a casa ganha sempre.

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