Foi há
exactamente um ano que uma cadeia de supermercados portuguesa, Pingo Doce,
investiu 10 milhões de euros num golpe de efeito: pagou extra aos seus
funcionários em todo o país para abrir no feriado 1 de Maio e vender os
produtos a 50% do preço habitual. Com isso, provocou motins entre pessoas para
quem açambarcar couves ou fraldas justifica a perda da dignidade pessoal, mas
não só: também chamou inadvertidamente a atenção sobre as margens de lucro
obscenas que a distribuição podia arrecadar num dia normal. De facto, se a
empresa que gere estes supermercados acabou por pagar uma multa (irrisória, de
12 mil euros) por vender um ou outro produto abaixo de custo (o que é ilegal),
o facto é que mesmo com tudo a metade do preço habitual continua a ser possível
ficar a ganhar dado que a margem de comercialização anda habitualmente pelos
70%, sobretudo em produtos alimentares. Já os produtores recebem tipicamente
15% do preço que pagamos por um bife que é amiúde borrachoso e cheio de nervo,
ou por uma maçã que parece saída de um instituto de beleza, de tão redonda, colorida
e perfeita – apenas apresentando o ligeiro problema de não ter quase nenhum
sabor.
Inconformados com
este estado de coisas, alguns vizinhos de uma zona pouco fabulosa de Nova York
decidiram criar o seu próprio supermercado. A ideia de base – tornar disponível
comida saudável e barata – é simples, mas é também algo que as grandes
superfícies não estão interessadas em fazer. A grande ruptura é conseguida
graças ao trabalho voluntário: só pode comprar na “Food Coop” quem for membro
da cooperativa, e só pode ser membro quem se dispuser a trabalhar perto de 3
horas por mês no supermercado. Não há excepções.
Esse trabalho
voluntário representa a maior parte das necessidades de gerir a empresa (há
alguns funcionários a tempo inteiro e pagos) e permite a esta grande superfície
comunitária cobrar preços tipicamente muito mais baixos, remunerar os
produtores de forma muitíssimo mais justa e, ainda assim apresentar lucro - que
é redistribuído pelos membros; estes já são 16 mil, provavelmente o máximo que
o sistema tem capacidade para acolher. E não são apenas os preços que atraem
mas também a qualidade dos produtos: produtos “locais” (tanto quanto a grande
cidade permite), muitos deles biológicos, e com uma indicação de origem que
pode ser tão precisa quanto a morada da quinta – e quanto mais pequena e
familiar for esta, melhor. Mas sem que a cooperativa tenha um ar de mercado de
rua, já que se trata de uma loja completa, uma “one stop shop” para fazer todas
as compras no mesmo sítio.
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