segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

As duas fugas de informação que ameaçam Copenhaga

Há uma regra que se aplica sem falhas à História da Humanidade: a informação circula cada vez mais depressa e em maior quantidade. A (errónea) lenda afirma que o pobre soldado grego Fidípides morreu exausto ao chegar a Atenas com a notícia (contida numa só palavra, “ganhámos”) da vitória sobre os persas em 490 AC, depois de correr 42 km, incidentalmente criando a prova da maratona; hoje, qualquer jogo de futebol entre a Grécia e o Irão, mesmo provavelmente aborrecido, pode ser seguido em tempo real por ecrã de telemóvel na América do Sul. Há um corolário daquela regra, apesar de bastante mais difícil de provar: é cada vez mais difícil impor restrições à informação e mantê-la confidencial. O segredo pode fugir para o grande público e provocar efeitos imprevisíveis – dois desses casos ameaçam esta semana o sucesso da crucial cimeira de Copenhaga sobre as alterações climáticas.

Fuga 1: o “ClimateGate”. A 17 de Novembro, um site de hackers publicou emails internos trocados ao longo de 13 anos por investigadores da Universidade de East Anglia, um dos centros de investigação climática mais avançados do mundo, incluindo sugestões sobre a necessidade de disfarçar o facto de as temperaturas médias globais não estarem a subir nos últimos anos. Os (poucos) cientistas “cépticos” amplificaram as passagens mais sumarentas, enquanto em Copenhaga, a Arábia Saudita – maior produtor mundial de petróleo – afirmou que o caso vem colocar dúvidas sobre as bases em que são feitas as negociações, enquanto nos EUA, imersos uma grande discussão interna sobre o clima, o Climategate já foi aproveitado como argumento pelos republicanos.

Fuga 2: o “Texto dinamarquês”. Um rascunho do acordo a assinar em Copenhaga, elaborado em segredo por um grupo de indivíduos que ficou conhecido como "o círculo do compromisso", foi terminado há algumas semanas, mostrado a um grupo muito restrito de países (desenvolvidos) e só deveria ser conhecido dentro de alguns dias. Mas na terça-feira foi publicado no “Guardian” (o mesmo jornal que tinha noticiado a fuga 1…) e provocou uma reacção furiosa dos países em desenvolvimento, que se sentem atraídos para uma cimeira onde tudo já estaria decidido de antemão – e em seu desfavor.

Ambas as fugas fariam apenas parte da “petite histoire” não fora pelo inconveniente pano de fundo: o esmagador consenso científico – intocado pelas fugas referidas – de que a acção do Homem está a mudar o clima; de que os oceanos estão a subir e as catástrofes naturais a aumentar; que o esforço, nomeadamente de redução de CO2, da nossa geração e seguintes terá de ser enorme, dando à cimeira que acaba na sexta em Copenhaga laivos de oportunidade imperdível. É que há uma máxima incontornável: o planeta Terra não tem uma capacidade infinita…

O anticlímax de Lisboa


Acaba de entrar em vigor, por fim, o Tratado de Lisboa. 1 de Dezembro de 2009 é uma data que vai figurar em todos os compêndios históricos sobre a União Europeia; a partir deste dia, foi dado mais um passo importante para a unificação do continente, para o melhor funcionamento das suas instituições e para o crescimento da presença europeia no mundo.

As primeiras decisões importantes tomadas sob a égide do novo tratado foram, naturalmente, sobre quem iria preencher os imponentes novos cargos criados na constelação dourada e azul. E a União, masoquista, decidiu não em função de si própria e dos seus interesses comuns (sobretudo exteriores), mas sim tomando em conta todas as suas limitações internas. Foi escolhido quem (ao contrário de Juncker com Sarkozy, por exemplo) nunca tinha aborrecido ninguém. Ou seja, perfeitos desconhecidos.

É legítimo perguntar neste momento: era mesmo necessário criar um novo cargo de presidente do Conselho que se sobrepõe ao já existente? Se a intenção era entregá-lo a um obscuro e veterano burocrata cuja visão sobre a Europa era desconhecida até há menos de um mês atrás, quando Van Rompuy fez um discurso de alguns minutos numa reunião do grupo Bilderberg – um poderoso clube que prima pelo secretismo –, então a resposta seria provavelmente não. Se a isto adicionarmos uma Alta Representante, Catherine Ashton, que nunca foi eleita para qualquer cargo, era há cinco anos subsecretária de Estado responsável pelos arquivos do parlamento inglês e não tem qualquer tipo de experiência diplomática, obtemos a receita para uma Europa funcionando em circuito fechado. O temido “método intergovernamental” entrou em acção; mais uma vez, os grandes países obtiveram o que desejavam, eminências pardas que não lhes fazem sombra – e dão uma pálida imagem de uma Europa que se arrisca, a continuar por este caminho sinuoso, a acordar num mundo irremediavelmente dividido entre EUA e China. E isto quando a União Europeia a 27 representa a maior economia do mundo!

A Europa foi desiludida. Onde lhe prometeram coragem, deram-lhe modéstia. Onde deveria estar a potência política, está um ex-primeiro-ministro tardio, temporário e não sufragado. Onde era preciso um símbolo de união, foi colocado um especialista da diversidade. A desejada independência da diplomacia europeia vai ser posta em marcha por uma oriunda da Grã-Bretanha, tradicional seguidora dos Estados Unidos.

Lisboa, como panaceia dos males de que padece a indecisa Europa, começa mal. Mas estas personalidades podem sempre revelar-se óptimas e agradáveis surpresas – e dada as baixas expectativas, têm mesmo todas as condições para isso. É mais que tempo de deixar de tergiversar e passar a agir – o comboio da História não espera por ninguém, nem mesmo pelo belo ideal de uma Europa em paz, livre, próspera e unida.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Amanhã há eleições presidenciais

Dia 19 de Novembro, uma fria quinta-feira, talvez o mesmo dia em que o caro leitor está a ler esta crónica em papel: a Europa elegerá o seu primeiro presidente. Claro que esta frase não é tecnicamente exacta – o cargo de presidente permanente do Conselho Europeu, acabado de criar por um Tratado de Lisboa que entra em vigor a 1 de Dezembro, não é realmente o de um Chefe de Estado; e o cargo de presidente do Conselho Europeu já existe há anos, só que durando seis meses e sendo ocupado pelo primeiro-ministro do país que detém a presidência (neste momento a Suécia, a partir de Janeiro a Espanha).
O problema é que a parte mais afastada da realidade na frase “A Europa elege o seu primeiro presidente” é mesmo o início. Não serão os cidadãos europeus a eleger o “seu” presidente. Na verdade, é difícil até identificar quem o faz; em teoria, são os 27 governos dos Estados-Membros, mas na verdade apenas uma ou duas pessoas influenciam a escolha dentro de cada governo, e o peso de cada um dos 27 também é muito diferente… Olhando de perto, o futuro mandatário por dois anos e meio (renováveis uma vez) será escolhido por 10 ou 20 europeus entre os cerca de 500 milhões que habitam esta “casa comum”. Para a causa do envolvimento dos cidadãos no grande projecto europeu, a conclusão não é brilhante. Porque não, por exemplo, eleger um certo número de candidatos, digamos 12, em eleições verdadeiramente pan-europeias, sendo posteriormente um desses 12 magníficos escolhido numa cimeira extraordinária como aquela que decorre amanhã em Bruxelas? A força e legitimidade da Europa sairiam reforçadas e essa grande invenção europeia denominada “democracia” seria mais honrada do que na situação actual, com nomes cozinhados atrás de portas fechadas e nos quais os media vão tentando acertar (ou criar), enquanto a maioria da população passa tranquilamente ao lado de mais uma decisão com impacto real na sua vida.

Quanto impacto? Depende de quem for eleito. Os jornais apontam o primeiro-ministro belga, Van Rompuy, como grande favorito – e o que não deixa de ser interessante, desde domingo que nos famosos bookmakers ingleses já não é possível apostar no próximo presidente, o que indica que o favorito é mais do que isso. Van Rompuy, que tem “Aquiles” no seu nome completo, tem o calcanhar de ser um perfeito desconhecido até há um ano atrás, quando foi designado para pacificar o seu difícil país. A sua eleição significará uma Europa introvertida e um cargo desenhado essencialmente como facilitador de consensos. Juncker, outro candidato, vem de um país que é mal visto devido ao segredo bancário, e detém uma característica que deveria ser uma vantagem mas infelizmente não é: a imagem “demasiado europeísta”. Para os resultados de corridas tão incertas e em que muitas vezes surge um nome inédito à última hora (que o diga Barroso) aos dois postos – também o de Alto-Representante da União para a Política Externa –, eu arriscaria apenas dois prognósticos: o presidente virá de um pequeno país da Europa do Norte; e um dos dois cargos será entregue a uma mulher.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Berlim, uma ilha com 20 anos

Em 1989 éramos todos jovens, mas não necessitamos disso como desculpa para explicar porque não nos lembramos das imagens nocturnas de bulldozers a destruir secções do Muro em Berlim entre aclamações de uma multidão ainda incrédula e com os olhos marejados de lágrimas de alegria: isto porque nos lembramos muito bem destas imagens.
Em Novembro de 1989, a situação na Alemanha de Leste era de turbilhão. O velho líder Erich Honecker, o mesmo que tinha em Janeiro afirmado que “o Muro durará mais cem anos”, tinha sido forçado a demitir-se havia duas semanas e a nova direcção do Partido Comunista, pressionada pela abertura das fronteiras nas vizinhas Hungria e Checoslováquia e por uma manifestação gigantesca em Alexanderplatz no dia 4, reúne na manhã do dia 9 e decide abrandar as restrições aplicadas a visitas ao Ocidente, prevendo mesmo a concessão de vistos temporários a cidadãos comuns, dentro de pouco tempo. É o porta-voz do Governo, Günther Schabowski, detentor no regime do cargo de secretário-geral da Propaganda, quem tem a incumbência de anunciar a medida à população. Schabowski senta-se para a conferência de imprensa acabado de regressar de uns diazinhos de férias e desconhecedor dos últimos desenvolvimentos; nas mãos tem apenas uma pequena e incompleta nota do Politburo. Quando os jornalistas lhe perguntam a partir de quando é que as restrições começarão a abrandar, o titubeante Schabowski afirma: “Tanto quanto sei, imediatamente!”. Num primeiro momento os jornalistas nem podem acreditar no alcance daquelas palavras. Segundos depois, a História começa a sua marcha inexorável: milhares de berlinenses inundam as cercanias do Muro e exigem aos atónitos guardas, os mesmos que atiraram para matar centenas de vezes ao longo de 28 anos de existência do Muro, entrar em Berlim Oeste. Depois de desesperados telefonemas sem sucesso para um poder que já não existia, os guardas acedem. A euforia é indescritível e os chamados “pica-paus” (pessoas que com picaretas ou guindastes deitaram abaixo o cimento grafitado) começariam no próprio dia o trabalho de demolição dos 156 km do Muro.

A data de 9 de Novembro é hoje um dos símbolos da reunificação europeia e, passados 20 anos, a grande cidade que é Berlim tenciona festejá-la condignamente. No fim-de-semana que passou foram os envelhecidos líderes políticos daquele tempo, Helmut Kohl, Mikhail Gorbatchov e George Bush pai (Mitterrand morreu e Thatcher tem Alzheimer em estado avançado), que posaram para uma fotografia de grupo; no dia 9 são os seus respectivos sucessores a fazê-lo. Mas a festa vem também para a rua: no dia 5, os U2 – cuja carreira é indissociável de Berlim – tocam na Porta de Brandenburgo. Depois há exposições, desfiles, fogos-de-artifício, concertos, tudo inserido num tão relaxado quanto ambicioso “Festival da Liberdade” que vai transportar os presentes de volta àqueles dias onde a História andou muito depressa, e onde a “ilha verde” que é a cidade de Berlim, 8 vezes mais extensa que Paris, voltou a ser o centro do Mundo.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Os automobilistas que paguem a crise

Em tempo de défices públicos crescentes, há muito que os Estados europeus encontraram uma forma aparentemente inesgotável de receitas: os infelizes automobilistas. As sacrificadas famílias que decidem deter um carro, ou os corajosos indivíduos que guiam um, vêem-se crivados de impostos, taxas, multas e imposições diárias. O exemplo mais gritante vem talvez de França, onde ser automobilista é hoje em dia um verdadeiro pesadelo (e não se fala aqui do trânsito caótico nas cidades ou das qualidades discutíveis do condutor francês médio, até porque há pior).

Fazer uma longa viagem de carro até Portugal, por exemplo, obriga-nos a atravessar dois grandes países europeus: França e Espanha. A passagem da fronteira de Hendaye para Irún, no fundo nada mais que duas localidades bascas, é no entanto muito vincada. Em França as auto-estradas têm quase sempre portagem, e bem alta; estão frequentemente (permanentemente, na Île-de-France) congestionadas; amiúde em obras; e sobretudo, pejadas de radares e de controlos policiais que, invariavelmente, incidem não sobre manobras perigosas mas sobre a velocidade instantânea de um veículo. A evolução das políticas para 2010 é a seguinte: cada litro de gasolina custará mais 11 cêntimos (tornando-a a segunda mais cara da União Europeia, depois dos Países Baixos) devido a uma nova “taxa sobre o carbono”; o número de radares, actualmente em 1400, duplicará em apenas um ano; os controlos de velocidade também aumentarão. Questão de segurança? Não, pura e simplesmente uma questão de dinheiro – dinheiro para os depauperados cofres do Estado francês, com as suas contas sempre no vermelho.

Se aceitarmos que os números de óbitos na estrada é uma medida fidedigna das políticas de segurança rodoviária, a repressão extrema – e custosa – praticada no Hexágono em relação a tudo o relacionado com o automóvel não está a resultar. Segundo números da Comissão Europeia, nos últimos 12 meses as mortes na estrada baixaram no país apenas em 1% – o quarto pior resultado da EU a 27, e apenas ligeiramente melhor que Grécia, Bulgária e Roménia. Na verdade, a comparação com o velho rival que segue na estrada uma filosofia de responsabilização em vez de repressão, a Alemanha, é embaraçosa para a França: quase os mesmos números absolutos de vítimas na estrada, quando há menos 20 milhões de gauleses, e quando as auto-estradas alemãs, mais antigas e em grande parte sem limite de velocidade, são cruzadas por camiões de toda a Europa…

Por vezes é possível encontrar cartazes nalgumas estradas secundárias em França: “Automobilistas = vacas leiteiras. Estamos fartos!”. Mas são precisamente os produtores de leite e não os automobilistas que estão na linha da frente da contestação social (e física) ao Estado. Talvez por isso uns paguem e outros sejam subsidiados.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Reinventar o Rio de Janeiro é uma ideia maravilhosa


O Rio vai organizar os Jogos Olímpicos em 2016 e esse atribuição de responsabilidades à Cidade Maravilhosa, tão bem-vinda quanto relativamente inesperada, vai consistir no primeiro grande projecto de renovação – mais do que isso, de reinvenção – urbana deste século XXI. Claro que as anteriores Olimpíadas realizadas em Sidney, Atenas e Pequim, bem como a de 2012 a ter lugar em Londres, provocaram também grandes mudanças na face destas grandes aglomerações humanas, mas o que está em causa no Rio de Janeiro é diferente: trata-se de recuperar, renovar e relançar – não tenho pejo em dizê-lo, trata-se de salvar – um dos locais míticos da Terra, a casa (e não por acaso Ruichi Sakamoto escolheu uma foto do Rio ao amanhecer como capa do seu excelente disco “Casa”...) de cerca de 12 milhões de pessoas em toda a sua área metropolitana. Uma casa que oscila entre a mansão em ruínas e o bairro social degradado.

O Rio de Janeiro, capital brasileira por mais de 200 anos até 1960, a capital do Império português por 13 anos (1808-1821), a capital simbólica e espiritual da brasilidade, da América do Sul e de toda uma certa forma de ver e viver a vida, o local de nascimento do “malandro” e da bossanova, a detentora do título oficioso de “cidade mais bela do mundo”: a grande cidade está marginal, maltratada e maltratante, estar lá é uma prova de coragem e resistência, não só um privilégio. É uma cidade bloqueada com problemas profundos, e os Jogos Olímpicos constituem a sua grande oportunidade. O que está em jogo é enorme: simplesmente, tornar a cidade no desejável epicentro de um novo Brasil poderoso e global, cuja economia deverá ser a quinta maior do mundo em 2016. Banco Mundial dixit.

A tarefa é titânica. Para os Jogos propriamente ditos, os maiores problemas a resolver são a falta de segurança (um eufemismo, numa das cidades mais violentas do mundo), os caóticos e poluentes transportes à base de autocarros (o metro é limitado) e as insuficiências de alojamento (faltam 20 000 camas em hotéis). Mas há também questões ambientais gigantescas na cidade que acolheu a primeira grande conferência mundial sobre o ambiente, em 1992. Os JO vão proporcionar a motivação ideal para despoluir as águas da baía de Guanabara e da lagoa Rodrigo de Freitas. Mas claro, as gigantescas favelas continuarão sem água potável ou recolha de lixo, muito menos vão deixar de existir. Os Jogos não resolvem problemas sociais, só podem – e não é pouco – mudar uma cidade. Só que para isso é preciso muita pasta, e o Brasil pensa investir 246 mil milhões de euros a preços correntes no Mundial de 2014 e nos Jogos de 2016; o mesmo dinheiro chegaria para construir sensivelmente 35 TGVs portugueses, ou 70 aeroportos de Alcochete. O importante, dizem, é mesmo competir.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Uma década de Barroso

Há um português que faz parte daquele restrito, muito restrito grupo de governantes verdadeiramente globais que podem (querendo e sabendo) influenciar as grandes decisões a tomar – por exemplo em alturas de grave crise económica – e que aparecem em todas as fotografias que realmente interessam – como aquela na famigerada cimeira dos Açores que decidiu a invasão do Iraque, juntamente com Bush, Blair e Aznar. Esse português chama-se José Manuel Barroso e foi reeleito na semana passada como presidente da Comissão Europeia por mais cinco anos. Em 2014, os europeus terão visto nada menos que dez anos de Barroso como presidente da instituição que é o tradicional motor da construção europeia, longevidade de que apenas o primeiro presidente da Comissão, o alemão Walter Hallstein, e o mais conceituado de todos, o francês Jacques Delors, se podem igualmente gabar.
Claro que existir um "presidente da Comissão Europeia português" é relevante pelo prestígio internacional; e também é possível, embora não demasiado provável, que a acrescida influência política do país possa ser importante para, por exemplo, assegurar sempre importantes fundos de coesão para Portugal. Acresce que Barroso era o único candidato proposto, o que significa que terá alguns méritos. Esses argumentos são esgrimidos sempre que um português balbucie algo que possa ser assemelhado a criticismo ao primeiro mandato barrosista. E no entanto…
No entanto, poucos europeístas estão especialmente entusiasmados com a reeleição de um presidente que viu a Comissão perder, uma vez mais, protagonismo e cuja reacção à crise financeira foi tardia, tímida e muitas vezes ignorada; uma Comissão que passa um teste crucial em duas semanas, devido ao referendo na Irlanda, e que se for aí bem sucedida terá de conviver com um Conselho Europeu ainda mais poderoso; uma Comissão que não tem um verdadeiro troféu para apresentar relativamente aos cinco anos passados, e cujo presidente é acusado amiúde de "não ter uma ideia para a Europa e ter passado demasiado tempo preocupado com a sua reeleição" (Die Zeit) ou de ser "apenas o joguete nas mãos de Angela Merkel" (Wolfgang Münchau do Financial Times, e Münchau não é qualquer um). O Le Monde refere-se a um dos seus epítetos políticos – o de "camaleão". Ao elegê-lo, o Parlamento Europeu exigiu-lhe efectivamente que mude, não de cor (o bronzeado de Barroso é sempre leve) mas de políticas. Veremos se daqui a mais cinco anos a oportunidade terá sido aproveitada.