terça-feira, 15 de janeiro de 2013

O homem que se triturou contra o sistema

A internet tem as suas próprias tragédias. Na semana passada sucedeu uma, e as ondas de choque ainda reverberam: de repente, os cidadãos digitais mais atentos apercebem-se da incrível importância de um homem de nome Aaron Swartz. E no entanto agora é tarde demais, porque Swartz desapareceu na sexta-feira, aos 26 anos de idade.

O menino-prodígio que aos 14 anos inventou a tecnologia RSS – hoje em dia ubíqua na rede, permitindo aos utilizadores receberem feeds com actualizações em tempo real com, por exemplo, notícias – tinha escrito o seu manifesto, “Guerrilha pelo Acesso Livre”, em 2008, o ano da grande crise; o livro abria com a frase “A informação é poder. E, como acontece com todo o poder, há aqueles que a querem guardar só para si”. Swartz, avesso a todas as formas de controlo abusivo, era um enorme paladino do acesso de todos à informação; ao defender a sua causa, estabelecia ao mesmo tempo para si próprio (e para os que o rodeavam, o que tornava as suas relações pessoais mais difíceis) padrões morais e intelectuais altíssimos, quase impossíveis de alcançar.

O ideal filosófico de que a informação é poder e deve ser partilhada livremente presidiu à concepção da Rede tal como a conhecemos (e não por acaso o “pai” da mesma, Tim Berners-Lee, foi dos primeiros a lamentar publicamente a perda de Swartz). Desde então, está sob constante ataque por parte de governos e corporações, interessados em manter os seus súbditos (nós) ignorantes e logo mais facilmente manipuláveis. Swartz era apenas uma pessoa, um jovem cuja inteligência prodigiosa lhe permitia encetar acções anti-sistema que considerava justas – como escrever um elegante programa de computador que permitia o acesso grátis a registos legais que eram antes duplamente pagos, por exemplo, ou ajudar a derrotar uma lei feita à medida das companhias discográficas, por exemplo. O dinossáurico sistema, bem entendido, queria usar a cabeça daquele idealista como exemplo disuassor e esperava uma oportunidade para se vingar; esta surgiu quando Swartz descarregou para o seu computador portátil 4,8 milhões de trabalhos científicos da base de dados do MIT, uma das mais prestigiadas universidades do mundo, de forma a disseminar esse conhecimento livre e gratuitamente pelo mundo em linha.

“Chamam-lhe roubo ou pirataria, como se partilhar a riqueza do conhecimento fosse o equivalente moral a pilhar um navio e assassinar a tripulação... mas partilhar não é imoral – é sim um imperativo moral. Apenas aqueles cegos pela ganância recusariam deixar um amigo fazer uma cópia.” O governo norte-americano não se impressionou com a profecia e levou Swartz a tribunal, mesmo após o MIT ter desistido da queixa. O julgamento começaria em abril próximo e a pena poderia ir até aos 35 anos de prisão, mais do dobro da pena máxima para assalto à mão armada. O homem de 26 anos que desafiou o sistema soçobrou perante a insanidade da palhaçada travestida de justiça, e foi encontrado sem vida em casa. Agora, a internet está inundada de chocados tributos a alguém excepcional – um idealista, um visionário, um pequeno génio irascível, um promotor do conhecimento humano, um homem de princípios irrevogáveis. Provavelmente um pouco de tudo isto, mas para mim o melhor elogio que se (lhe) pode fazer é: um valoroso defensor da liberdade.

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