Passos Coelho
poderia ter razão – se se estivesse a referir ao regabofe em que vive a antiga
capital do império, Lisboa. Se os 20 anos incluíssem o Centro Cultural (ou
Comercial) de Belém, os negócios obscuros da Expo98, os cerca de 1000 km de
auto-estradas SCUT disponíveis na região do Vale do Tejo, as centenas de milhar
de funcionários públicos concentrados na capital, as suas estações de metro e
hospitais novos e subutilizados enquanto que no resto do país eles encerram,
bom, aí a sua análise seria desgraçadamente certeira. Mas conhecendo nós como
conhecemos os nossos actores políticos, a frase não passa de uma variação da
conhecida narrativa “andámos a viver acima das nossas possibilidades” que nos
tem vindo a ser impingida há alguns anos pelos arautos da austeridade – estando
ela já completamente desacreditada.
Nunca é demais
repeti-lo: a crise em que vivemos não foi provocada por desmesurada despesa
pública. Mais uma vez: não foi provocada por demasiada despesa pública.
Sobretudo sabendo que o Estado gasta mais em juros da sua dívida (que, sendo hoje
em dia bem maior do que há cinco anos, se vai tornando efectivamente
impagável...) do que aquilo que investe em educação ou investigação
tecnológica, por exemplo. Em 2007, todos os países da zona euro (à excepção da
Grécia) tinham
indicadores económicos sólidos, relativamente baixos défices,
dívidas controladas. Espanha e Irlanda tinham mesmo superavits orçamentais e
estavam assim em melhor posição fiscal que a Alemanha ou a França, por exemplo,
e Portugal também não estava longe.
Aquilo que
despoletou o marasmo em que, exportadores alemães à parte, vivemos hoje na
Europa foram os resgates com dinheiros públicos feitos para salvar bancos
privados e, em menor medida, a perda de receita de impostos provocada pela
drástica diminuição da actividade económica directamente decorrente da
imposição de uma austeridade draconiana – esta é renegada hoje por grande parte
dos seus próprios criadores, mas continua em vigor e sem fim à vista para o
túnel. Se o diagnóstico está errado, não admira que a cura receitada também o
esteja.
A frase batida do
primeiro-ministro atira-nos mais areia para os olhos, e é pena. Após tanto
tempo de troikas, o que os europeus precisam é das boas notícias que nunca
chegam; não de mais radicalismo ideológico travestido em fantasmas do passado.
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