segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Como destruir o bom gigante

... e de caminho ganhar 25 milhões por fazê-lo. Ou então, “Como roubar a Nokia e receber de recompensa a Microsoft”. Ambos são possíveis títulos para a futura autobiografia de um homem chamado Stephen Elop.

Elop, um homem redondo e de aparência um tanto alarve, foi escolhido em 2010 para dar um rumo novo ao gigante europeu de tecnologia. O próprio facto de ser o primeiro gestor não-finlandês da Nokia era suposto simbolizar o corte com a confortável estratégia de sempre – vender telefones na sua maioria relativamente baratos e com poucas características mas sólidos, fiáveis e óptimos para fazer chamadas. Era dessa forma que uma companhia europeia esmagava um dos mais apetecíveis mercados globais – e digo esmagava pois isso significa que vendia mais do dobro dos telefones do seu mais directo perseguidor, a Samsung. Só em telefones, a Nokia tinha receitas anuais de 29 mil milhões de euros; e mesmo só contando smartphones, um produto no qual a empresa tinha sido pioneira mas não estava a responder ao sucesso do iPhone, os resultados continuavam excelentes – 35% do mercado e 104 milhões de smartphones vendidos, mais do que Apple e Blackberry juntas! Em 2010, era esse o presente da companhia – e todos os analistas concordavam que, tomando as boas decisões, a liderança seria para manter.

Entra Stephen Elop, contratado à Microsoft. Poucos meses depois, em Fevereiro de 2011, escreve uma mensagem a todos os empregados em que comparava a Nokia a uma “plataforma em chamas”, prosseguindo num tom em que autoflagelava a empresa, líder absoluta de mercado, para ao mesmo tempo elogiar Apple e Google, os novos concorrentes. O texto tornou-se histórico pelas piores razões: destruiu a moral da companhia e a confiança de muitos dos seus clientes. Foi uma verdadeira profecia que se auto-realiza, aquilo que é designado de “efeito Ratner” (nome de um vendedor de jóias que em 1991 gozou publicamente com os seus produtos e quase levou a companhia à falência com um simples discurso).

Mas Elop ainda não tinha terminado o serviço que lhe tinha sido encomendado. A Nokia tinha passado os últimos anos a investir no desenvolvimento de um sistema operativo próprio, o MeeGo, para concorrer com Android e iOS. A meio de 2011, por entre grande excitação e críticas especializadas muito favoráveis, a Nokia apresenta o N9 – o primeiro modelo a utilizar o novo e próprio sistema; e no dia seguinte, o presidente da companhia, o americano Elop, anuncia que não haverá mais nenhum telefone MeeGo, pois a Nokia iria comprar o Windows Phone da Microsoft – um péssimo sistema que não estava sequer pronto. O N9 foi morto à nascença e a Nokia não teve durante quase um ano nenhum smartphone com Windows para vender. Agora, apenas três anos depois da chegada de Elop, eles existem – chamam-se Lumia – e a empresa vendeu uns míseros 7 milhões de unidades, perdendo dinheiro em cada um deles; de líder mundial, passou a ocupar a nona posição dos fabricantes, com 3% do mercado; e mais importante, tem agora prejuízos consideráveis e cada acção vale um décimo do que valia. Arruinada a empresa, foi fácil à Microsoft comprar os ossos que restam por tostões (menos do que foi pago, há dois anos, pela Skype); e Elop, finalmente despedido, leva  para casa como recompensa por ter destruído uma empresa fantástica um “pára-quedas dourado” de 25 milhões de dólares.

Eu disse para casa? Na verdade ele volta para a Microsoft, o mesmíssimo império a quem Elop acaba de oferecer a antigamente orgulhosa Nokia, agora destituída de valor, de patentes e de pessoas. Fecha-se o círculo, e fecham-se-nos os olhos de vergonha.

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