Lembra-se da crise? Claro que sim, ela não deixa passar
muito tempo sem nos enviar um lembrete. Começou há uma eternidade e nem nos
abandonou nem parece a caminho de o fazer; pelo contrário, os indicadores
económicos estão a voltar a semear o temor pelas empresas e bolsas. É preciso
ser muito claro: este estado miserável da economia europeia, seis anos
volvidos, é causado pelas opções suicidárias que tomámos.
Ainda há poucos meses os sicários da austeridade –
os mesmos que monopolizam vários governos, ditam a política económica e ocupam
posições-chave entre os fazedores de opinião para melhor a publicitar –
cantavam vitória por melhorias decimais de um ou outro indicador. O PIB da
Irlanda deixou de cair, o desemprego em Portugal já não cresce tanto. A
periferia europeia conseguiu voltar aos mercados e as taxas de juros dos
empréstimos caíram a pique, tudo devido a quatro palavras proferidas pelo
presidente do BCE: o euro será defendido “custe o que custar” – e os mercados
acalmaram, percebendo que Portugal, Espanha, Itália não iriam à bancarrota pois
não teriam falta de liquidez.
Mas os desequilíbrios continuam lá. E em vez de os
corrigir, seis anos depois, continuamos a prolongar a agonia económica com os
mesmos erros cometidos pelo Japão, ao longo das suas “duas décadas perdidas”
(que ainda não terminaram), ou pelos EUA durante a Grande Depressão. Há anos,
escrevi aqui nesta mesma coluna que vivíamos como que “presos no ano infindável
de 1931”. O mais extraordinário é que os anos passam, continuamos sem ver a luz
ao fundo do túnel – pelo contrário, o túnel parece agora voltar a escurecer – e
ninguém se revolta, nem aprendemos nada.
Em 1931 essa revolta aconteceu. Quem estava a dirigir a economia americana para o abismo perdeu as eleições, e Roosevelt tornou-se presidente para aplicar um programa que era em certo sentido o oposto da cura austeritária: enorme investimento público, expansão salarial, descida das taxas de juro. Quatro anos mais tarde, o desemprego tinha descido de 25% para 14%; se o mesmo fosse obtido hoje, poderíamos chegar a uma situação de pleno emprego…
Roosevelt, que passou as últimas décadas da sua vida
numa cadeira de rodas devido à poliomielite, foi um político tão excepcional
como irrepetível. Agora, temos como condutor o ministro das Finanças alemão,
Schäuble (numa coincidência macabra, também ele preso a uma cadeira de rodas).
E ainda anteontem o contabilista de Merkel repetiu a sua narrativa, atribuindo
(erradamente, como hoje sabemos) a culpa à irresponsabilidade fiscal dos países
do Sul; ou seja, seis anos depois, as nossas perspectivas são as de persistir
no autismo, em vez de procurar a solução.
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