O luxemburguês Jean-Claude Juncker ultrapassou,
com um voto favorável no Parlamento Europeu, o último obstáculo na sua longa
corrida para se tornar presidente da Comissão. Juncker precisava do apoio de
uma maioria simples dos 751 deputados (ou seja, pelo menos de 376), o que foi
garantido com relativo à-vontade na sessão plenária de 15 de Julho.
Escrevi as linhas acima um dia antes dos
factos se verificarem, devido à data de fecho da edição do jornal em papel. Mas
a futurologia é possível quando está bem ancorada em informação relevante:
assim como não é difícil prever que equipas cujos treinadores não percebam
muito de táctica e escolham jogadores em má forma não vão ganhar o campeonato
do mundo de futebol, também é um risco calculado afirmar que Juncker será
realmente eleito. Porque o democrata-cristão fez o seu trabalho de casa,
trabalhando na sombra para assegurar que não existiriam surpresas de última
hora. Um bom exemplo foi a forma como se sujeitou a uma reunião com cada um dos
sete grupos políticos europeus, procurando dizer a cada um deles o que eles
gostariam de ouvir: aos socialistas (que o têm apoiado mesmo mais que o seu
próprio grupo) prometeu várias pastas incluindo a da Economia; aos eurocépticos
reformistas, jurou “que não era um federalista”; aos liberais, que a
“composição da sua Comissão estava totalmente em aberto” (negando assim o que
tinha dito algumas horas antes).
Aos Verdes, grupo crucial e dividido na sua
posição perante Juncker, foi prometida a oposição aos organismos geneticamente
modificados e à privatização de serviços públicos, por exemplo. Mas mais uma
vez as principais questões receberam uma resposta vaga e evasiva, algo de que
todos os grupos, mesmo os democratas-cristãos, se queixaram. Do encontro com o
novo grupo de direita populista, pouco interessado em discutir temas de fundo,
não rezou a História. Mas o verniz político estalou de uma forma desagradável
com o grupo da extrema-esquerda, que já era obviamente adverso a votar no
luxemburguês. Juncker, preocupado com o seu telemóvel, primeiro demonstrou não
dar a mínima importância ao que dizia o deputado português João Ferreira; em
seguida aconselhou-o a ser breve “porque tem cinco vizinhos portugueses”, logo nem
precisando de tradução para perceber a língua e “conhecendo bem” a situação do
país, revelando ali um lado do político que os luxemburgueses conhecem bem:
irascível, rude, paternalista. No seu pequeno país de origem, cheio de humildes
vizinhos portugueses, Juncker pode eventualmente dar-se a esse luxo; como
presidente da Comissão Europeia, gerindo os delicados equilíbrios políticos
gerados por 500 milhões de habitantes do continente mais rico do mundo, não
pode.
Juncker
parece esquecer-se que a sua aprovação pelo PE decorre principalmente da
vontade de respeitar a escolha democrática vinda das eleições europeias – e não
de um genuíno entusiasmo pela sua pessoa ou o seu percurso. Ignorando este
simples facto político, perdendo a capacidade de escutar e reagir às críticas,
Juncker arrisca-se a ter recorrer mais vezes aos seus alegados vizinhos como
fonte de ligação ao mundo real. Esperemos que nenhum deles se chame Cristóvão
Colombo.
Sem comentários:
Enviar um comentário