Sexta-feira passada foi dia
de duelo ao anoitecer. Schäuble e Varoufakis encontraram-se frente a frente
numa rua poeirenta de Bruxelas e os seus olhares impiedosos cruzaram-se num
frémito de desprezo. O ministro das Finanças alemão sentado na sua carreira de
rodas, e o ministro das Finanças grego dentro do seu blusão de cabedal à
motoqueiro, fizeram uma pausa antes de disparar. Algures ouviu-se uma
harmónica.
E então, dentro do Conselho
Europeu extraordinário, começou o duelo, ou seja a negociação. O novo governo
grego entrou nesta com uma corda ao pescoço, pois só tinha financiamento para
as suas dívidas até dia 28 de Fevereiro. A sua pretensão era a obtenção de uma
linha de crédito que permitisse ao país ir respirando até ao verão, mas sem que
esse dinheiro viesse condicionado às irresponsáveis exigências da troika. Não era essa a única
reivindicação do pistoleiro Varoufakis, claro; digamos que a Grécia entrou no
duelo exigindo 20. E a Alemanh… perdão, a Europa respondia que estava disposta
a conceder zero.
No final a Grécia obteve 2;
ou seja uma possibilidade de reduzir ligeiramente o excedente orçamental exigido
(ainda assim fixado nuns totalmente utópicos 4,5% antes do pagamento de juros
da dívida, isto já para 2016); e quatro meses de prolongamento do programa de
empréstimos vigiado pela troika. Esta
última palavra desaparece, mas trata-se apenas de uma questão semântica – o
BCE, a Comissão Europeia e o FMI continuarão a vigiar de perto, assegurando que
as medidas de austeridade não abrandem, antes pelo contrário.
Não era esse o mandato do
Syriza, reverter as políticas autoderrotistas e virar a agulha para o
crescimento? Claro, e nesse aspecto o acordo atingido na sexta-feira constitui
para eles (e nós) uma derrota em toda a linha – o que já está a provocar
contestação no próprio governo grego, que será obrigado a impor medidas em tudo
semelhantes às dos seus antecessores. O primeiro-ministro pode sempre alegar
que obter “2” é sempre melhor que obter “0”, e talvez mais importante ainda é o
facto de existirem aqui outras vitórias mais intangíveis – a capacidade de um
país humilhado se levantar e voltar a discutir olhos nos olhos, ao mais alto
nível (e não apenas com burocratas não eleitos), uma solução alternativa que
sirva a todos os europeus e não passe simplesmente pela lenta agonia sem fim
imposta pela Alemanha.
Essas ideias não passaram.
O choque com a realidade revelou-se muito forte, e o senhor Schäuble venceu o
primeiro duelo. Para isso ajudou contar com todo um arsenal, mas também com
dedicados acólitos (no fundo todos os restantes ministros da zona euro mais o
inefável Dijsselbloem) e dois políticos travestidos de abutres: os dois
ministros das Finanças ibéricos, com o espanhol a gritar “mata!” e a portuguesa
“esfola!”. Apesar destes dois países serem precisamente aqueles que mais teriam
a ganhar com uma mudança das políticas que os empobreceram, os seus governos de
direita estão tão assustados com um possível sucesso do novo governo grego e do
contágio que isso provocaria nos seus países que decidiram borrifar-se para o
interesse nacional e aparecer ao mundo como “mais alemães que os próprios
alemães”. A sua oposição a qualquer alívio para a Grécia foi encarniçada e a
ministra portuguesa até viajou de antemão a Berlim para pedir “pessoalmente” a
Schäuble que não “cedesse”.
No meio da cegueira e da estupidez políticas, a ministra acertou: a sua posição é apenas pessoal. Estes governantes cínicos e destrutivos não me representam, nem a Portugal, muito menos à Europa. Por eles vejo-me obrigado a dizer aos gregos: signomi (desculpem).
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