terça-feira, 20 de maio de 2014

O que é que a Europa fez por nós?

“O que é que os romanos fizeram por nós?”, diz o homem alto, com vestes que o localizam na Palestina de há dois mil anos atrás. O tom peremptório identifica um discurso político – este homem procura convencer o seu pequeno público. “O império romano tirou-nos tudo, a nós e aos nossos pais. É preciso desmantelá-lo. O que é que alguma vez esses romanos fizeram por nós??”, insiste o homem. Um dos que o escutam levanta-se a medo. “O aqueduto”, responde. Outro adiciona: “a irrigação!” Um terceiro acrescenta “as estradas!”, e uma a uma todas as grandes dádivas civilizacionais dos romanos vão sendo referidas: a rede sanitária, a medicina, a educação, o vinho, a segurança, os banhos termais. Quando um dos presentes refere o argumento definitivo – “a Paz” – o desautorizado líder perde a paciência: “oh, cala-te!”

A cena cómica é muito famosa, o filme também: “A vida de Brian”, obra-prima controversa dos Monty Python, o velhíssimo grupo de comediantes britânicos que decidiu voltar ao activo este Julho. A sátira política aqui contida não é demasiado subtil, mas é tão certeira e original que serve de modelo a muitas perspectivas. A da União Europeia é claramente a de se identificar com o império romano da história.

A poucas horas das eleições europeias de 2014, é compreensível que o Parlamento Europeu se sinta algo injustiçado: após as suas mais de mil leis europeias adoptadas no último quinquénio, o ambiente que se vive é amargo, os eleitores alternam entre o desencanto, a revolta e a tentação do populismo extremista. No Reino Unido e em França, as velhas grandes potências ocidentais que tantas vezes serviram de baluarte à democracia e foram as primeiras a perceber que esta corria perigo devido ao nazismo, o maior número de votos vai ser dirigido a dois partidos racistas, discriminatórios e demagogos de inspiração fascista.

A tentação é a de combater este horror com doses acrescidas de discurso positivo. O que é que a UE alguma vez fez por nós? Pois bem, fundos regionais, voos e telefonemas muito mais baratos, protecção alimentar e dos consumidores, melhores padrões ambientais, o mercado único, a livre circulação de pessoas e capitais… a Paz. A lista poderia ser muito mais longa e é de respeito. Mas sofre de dois defeitos profundos: desde logo é demasiado técnica e especializada para entusiasmar o comum dos mortais, para quem todas estas vantagens não parecem importantes até que elas desapareçam (nada está nunca garantido…).

Mas sobretudo, enfatizar as conquistas do passado simplesmente não chega para assegurar a relevância presente e futura. Mergulhada em várias crises – económica, filosófica, de confiança – a Europa precisa de novos desígnios para se poder relançar, solidariamente, e voltar ao centro das preocupações dos seus cidadãos distraídos por querelas intestinas ou por esse pormenor da luta pela sobrevivência. A pergunta certa é “o que poderá a Europa fazer por nós?” E a resposta é “muitíssimo”. Mas tudo começa por votar, e votar bem, no domingo.

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