Paris. Vértice da
civilização ocidental, construção real como imaginária de diferentes vontades,
sonhos e realizações. E como cidade global, Paris apresentou-se como anfitriã
da “cimeira da última oportunidade”: ou os líderes mundiais chegavam a um acordo
para limitar as emissões de gases e salvar a Terra do futuro, ou seria
demasiado tarde.
A dramatização
ajudou a negociação, claro. Sem esse sentimento de ter os olhos ansiosos e
reprovadores da população postos sobre si, os líderes políticos estariam muito
menos preocupados em conseguir algum tipo de acordo. Mas essa mesma
dramatização ajudou à criação de uma narrativa política autocongratulatória,
onde o problema é vendido como titânico e as possibilidades de conseguir algo
de positivo consideradas como muito baixas, para que no final qualquer acordo
seja apresentado como um enorme alívio e uma retumbante vitória – e os seus
obreiros políticos, claro, vistos como autênticos heróis.
O guião foi seguido
à risca, os líderes mundiais foram pressurosos a anunciar uma “vitória
histórica” logo no sábado à noite, e a imprensa mundial alinhada serviu-lhes
mais uma vez de caixa de ressonância com títulos feitos a metro. “Acordo
ambicioso”, “186 países signatários”, “Aumento da temperatura contido a +1,5
ºC”. Foi um fim de semana recompensador em termos de notícias mundiais, se
também contarmos as eleições na Arábia Saudita (onde mulheres puderam ser
eleitas pela primeira vez) e as regionais em França (onde uma mulher, líder da
Frente Nacional, ficou de mãos vazias).

Apontar para um
objectivo de “apenas” 1,5 ºC graus de aumento de temperatura global é uma
espécie de resolução de Ano Novo: uma intenção louvável que não passará disso
se a determinação falhar e os meios não existirem. Hansen avisa que isto não
passa de uma promessa vazia, “só palavras, nada de acção”. Os combustíveis
fósseis podem ter visto em Paris o início do seu declínio, mas continuarão a
ser os mais baratos, pois continuam livres de taxação ecológica – uma conquista
das petrolíferas em Paris. E as emissões provindas de transportes, a indústria
mais poluente do planeta, nem sequer são consideradas no acordo – mais uma
conquista de lobbyistas poderosos em relação ao texto final. Texto esse que não
inclui na sua parte obrigatória as contribuições de cada país – ou seja, a
parte das medidas concretas cabe às melhores decisões de cada um, e isso é uma
história que raramente tem um final feliz. Actualmente, as propostas actuais de
cada país já significam um aumento a longo prazo de de 3,7 ºC.
A diferença parece
subtil mas na realidade é catastrófica. A esse nível, metade das ilhas do
Pacífico desaparecem, e metrópoles costeiras como Barcelona, Nova York ou
Shanghai ficam ameaçadas devido à subida do nível dos oceanos. Além disso a
água potável do mundo reduz-se em um terço, e as colheitas em 25%, tornando a
vida no planeta insustentável para grande parte da Humanidade. Paris, “uma
grande vitória”, como outros acordos antes assim foram anunciados. E assim
vamos de vitória em vitória, até à grande derrota final.
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