Novembro de 1989. No
regime comunista da Alemanha de Leste, nem tudo se passa como antes: o velho
ditador Erich Honecker sai finalmente de cena – poucos meses antes tinha
afirmado “o Muro estará de pé daqui a 50 ou mesmo 100 anos” – e é substituído
pelo mais moderado Egon Krenz. Pressionado pela recente abertura das fronteiras
na Hungria, no que tinha sido a primeira brecha na Cortina de Ferro (numa
amarga ironia histórica, a Hungria dos nossos dias foi o primeiro país a erguer
um muro para bloquear os refugiados de 2015), afundados pela depauperada
situação económica da RDA, os novos dirigentes encontram uma única forma de
fazer dinheiro rapidamente: rentabilizar a liberdade de circulação dos seus
cidadãos. À capitalista Alemanha Ocidental chega então uma proposta milionária,
o relaxamento dos controlos de fronteira entre Leste e Oeste, em troca de 5 mil
milhões de euros à cabeça mais 2 mil milhões anuais. Mas em Bona, Helmut Kohl
recusa a chantagem.
O regime
leste-alemão tentou então ganhar tempo para sobreviver, introduzindo algumas
reformas. Um dos membros do partido, o ex-jornalista Günter Schabowski, ia
surgindo como porta-voz oficioso para, em monótonas conferências de imprensa,
dar a impressão que algo ia mudando para que tudo pudesse continuar na mesma em
Berlin-Leste, na Cidade de Karl Marx e na restante RDA. Era esse o caso, mais
uma vez, naquele fim de tarde no dia 9; após uma hora, a conferência estava
prestes a terminar. Até que…

Depois do burburinho
na sala, a notícia espalhou-se como fogo numa floresta de eucaliptos durante o
verão. Pouco depois das sete da tarde, a televisão pública ocidental já
avançava a notícia. Os alemães de leste começaram a dirigir-se em massa para o
Muro, arriscando-se a levar um tiro como tantos outros antes deles. Os guardas
não faziam ideia como reagir, nada daquilo estava previsto, tinha surgido de um
lapso de um burocrata do aparelho. Finalmente, às 23:30, os portões do Muro
foram abertos – o momento metafórico em que o Muro caiu. Os habitantes de
Berlim-Leste irromperam pelo Oeste, em lágrimas, a divisão comunismo vs
capitalismo dissolveu-se aí, os regimes totalitários na Europa caíram como
dominós.
Günter Schabowski
apagou-se este domingo, aos 86 anos. Vivia na parte Oeste de Berlim, e depois
do desaparecimento da RDA ainda escreveu mais alguns capítulos da sua história
pessoal: voltou ao jornalismo, foi condenado a 3 anos de prisão por “autoria
moral” dos disparos dos guardas de fronteira (cumpriu um) e fez assessoria de
candidatos políticos da CDU alemã (o partido de Merkel, de centro-direita).
Também deu origem a uma expressão em alemão – um “momento Schabowski” é aquele
em que dizemos algo sem prever as consequências. Mas acima de tudo, com uma
frase atabalhoada, este homem derrubou o Muro de Berlim naquela noite.
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