Qualquer pessoa que
veja filmes americanos o sabe: a estratégia para fazer falar um suspeito é
metê-lo numa sala com dois polícias, o mau e o bom (“good cop/bad cop”); o mau
ameaça o bandido com décadas de cadeia, o bom tenta ganhar a confiança do
meliante, diz que está ali para o ajudar se ele colaborar, acalma o parceiro…
no caso seguinte, os polícias trocam de papel.
Esta é um pouco a
metáfora da Conferência sobre o Clima que começou esta semana em Paris – a COP
(Conferência das Partes). O mundo político reúne-se em mais uma tentativa para
limitar as alterações climáticas. E os líderes dos maiores países, os que
contribuem de forma mais significativa para aumentar as emissões de gases
poluentes, expressam-se em coro alinhado. “Sim, as alterações climáticas são um
grande desafio que se nos coloca. Sim, apenas uma acção decisiva e concertada
de todo o planeta será capaz de responder adequadamente. De Paris terá de sair
um acordo firme e ambicioso que consiga controlar as emissões globais. E sim,
claro, o país que eu lidero está na linha da frente, a fazer um enorme
esforço!”
Mas as belas
palavras são contrabalançadas por um discurso mais assustador – e mais
inconvenientemente realista. Os presidentes do Quiribati e das Maldivas, por
exemplo, apelaram a que se faça algum combate de concreto, mas sublinharam que
para eles já é tarde: as suas populações já fizeram as malas e estão preparadas
para abandonar as ilhas, em breve submersas. E os países em desenvolvimento,
hoje em dia já responsáveis por 65% das emissões globais, continuam a insistir
que as “responsabilidades históricas” dos países mais ricos devem fazer cair o
grosso dos esforços de redução para o nosso lado, enquanto a China e a Índia
abrem a cada ano dezenas de centrais de queima de carvão – essa divisão entre
países mais ricos e aqueles em vias de o ser foi afinal o que provocou o
falhanço de todas as outras cimeiras até agora, desde a do Rio de Janeiro em
1992 até Lima em 2014. As probabilidades de novo estrondoso fracasso em Paris
são enormes.
É irónico. O que
está em cima da mesa é simplesmente a manutenção do planeta Terra de forma a
que a espécie humana nele possa sobreviver – dir-se-ia que o tema merece alguma
da nossa atenção. Alguns factos que resumem a dimensão do problema: 13 dos 14
anos mais quentes de sempre aconteceram neste século, e 2015 será o mais quente
de toda a História; isto acontece porque a concentração de CO2 na atmosfera é a
maior dos últimos 800 000 anos, e está sempre a aumentar. Além da subida da
temperatura, há mais fenómenos climáticos extremos e uma subida rápida do nível
dos oceanos devido ao derretimento dos gelos polares – nos últimos 35 anos
perdemos ali o equivalente à área de toda a Europa Ocidental. O custo da
inacção passada é tremendo, já só podemos limitar os danos. Mesmo adoptando
todas as medidas propostas em Paris, no ano 2100 a temperatura do planeta será
ainda assim de +2,7 ºC em relação aos níveis pré-industriais; o custo de não
fazer nada será, por outro lado, um aumento de 4,5 ºC que tornará a vida neste
planeta inviável para a maior parte dos seres vivos, privados de água e comida.
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